O que antes eram duas potências, agora são, no mínimo, três. A nuclearização no cenário da geopolítica mudou drasticamente nos últimos tempos. Essa corrida armamentista tão peculiar ampliou o número de nações envolvidas: temos o lado chinês e o lado americano, com o Project 25 de fundo durante a administração de Donald Trump. Se ainda havia algum tipo de incerteza quanto a essas mudanças, Washington acaba de eliminá-las com um documento de 182 páginas.
O arsenal asiático
O relatório aponta que a China continua ampliando sua capacidade militar, especialmente seu arsenal nuclear, apesar de recentes investigações de corrupção que abalaram as altas esferas do Exército Popular de Libertação da China (EPL), uma das forças de defesa daquele país. Segundo o Pentágono, responsável pela publicação, o país adicionou aproximadamente 100 ogivas nucleares no último ano, alcançando um total estimado de mais de 600 até meados de 2024, com planos de superar 1.000 unidades até 2030.
Embora isso ainda deixe o país distante dos números de Estados Unidos e Rússia, essa expansão visa fornecer à China uma capacidade destrutiva significativamente maior a curto prazo, juntamente com um amplo leque de opções estratégicas em caso de conflito com os EUA ou qualquer outro adversário.
Infraestrutura militar em expansão
Os documentos apontam que a China completou a criação de três campos de mísseis com 320 silos em seus desertos no norte, e que continua construindo mais silos para abrigar mísseis Dongfeng-5, capazes de carregar múltiplas ogivas. Essa modernização militar visa melhorar significativamente sua capacidade de causar danos devastadores em um eventual intercâmbio nuclear, além de ampliar sua capacidade de ameaçar cidades, instalações militares e líderes dos Estados Unidos, conforme o relatório.
Diversificação
Além de aumentar seu arsenal, a China está desenvolvendo uma força nuclear diversificada que inclui mísseis de baixa potência para ataques de precisão e mísseis balísticos intercontinentais (ICBMs) com múltiplas opções de escalada. Essa abordagem representaria uma evolução em relação à sua postura nuclear tradicional. Embora Pequim mantenha uma política declarada de "não primeiro uso", a velocidade de sua modernização nuclear gerou preocupações nos EUA, de acordo com o Pentágono.
Tecnologias avançadas
O relatório destaca que a China está desenvolvendo sistemas avançados, como veículos de voo hipersônico e sistemas de bombardeio orbital fracionado. Ambas as tecnologias, projetadas em parte para contrapor as capacidades de defesa antimísseis dos Estados Unidos, tornam um ataque nuclear mais difícil de detectar e rastrear. Nesse sentido, em 2021, a China realizou um teste combinando ambas as tecnologias, consolidando sua posição como líder em inovação armamentista.
Desafios internos: corrupção
Como mencionamos no início, o progresso militar da China tem enfrentado interrupções devido a investigações de corrupção que envolvem altos funcionários do EPL, incluindo ministros da defesa acusados de aceitar subornos e vender promoções. Embora esses escândalos possam ter afetado a confiança nos líderes militares, o Pentágono considera que seu impacto nos programas de modernização foi limitado, descrevendo-os como um "obstáculo menor".
A Marinha da China, assim como a da Rússia, aumentou significativamente seu alcance, consolidando-se como uma força marítima emergente capaz de operar além de suas águas regionais. Segundo o relatório do Pentágono, o EPL conta com mais de 370 navios e tem realizado treinamentos e operações em oceanos distantes, incluindo o Índico Oriental e o Pacífico Ocidental, além de visitas a portos na África e no Oriente Médio.
Desde 2008, a China mantém uma presença contínua no Golfo de Adem (costa sul da Península Arábica), com uma base permanente em Djibouti, o que reforça sua ambição de projetar poder além de suas fronteiras.
Modernização das frotas
Nesse sentido, plataformas antigas foram substituídas por navios modernos e polivalentes, equipados com sistemas avançados de armas antinavio, antissubmarino e antiaéreos. Entre eles, destaca-se o cruzador da classe Renhai (Tipo 055), com um sistema de lançamento vertical de 112 células e capacidades para múltiplas missões, superando em tamanho seus equivalentes americanos.
Além disso, o desenvolvimento de porta-aviões como o Fujian, o primeiro projetado localmente com catapultas eletromagnéticas, amplia as capacidades de projeção aérea. Esse esforço é complementado com uma crescente frota de navios anfíbios, como os das classes Tipo 071 e Tipo 075, preparados para operações expedicionárias e apoio logístico de longo alcance.
Taiwan
Os Estados Unidos indicam que parte dos esforços militares atuais da China estão direcionados a Taiwan, considerada por Pequim como uma parte indivisível de seu território. Embora a China tenha aumentado as incursões aéreas e navais perto da ilha, o Pentágono observa que o país ainda enfrenta deficiências significativas, como limitações na guerra urbana e na manutenção de suprimentos a longas distâncias, o que dificulta uma invasão anfíbia confiável. Um possível ataque a Taiwan, pelo menos por enquanto, é visto como um risco político e militar considerável para o Partido Comunista.
Resposta dos EUA
E o que fazem os Estados Unidos em resposta à China? A administração Biden parece ter fortalecido alianças na região Ásia-Pacífico e desenvolvido estratégias de dispersão de forças para facilitar ataques rápidos contra ativos chineses. Sem dúvida, o relatório pode influenciar a abordagem da administração Trump que está por vir, redirecionando a atenção para a crescente ameaça militar chinesa em um contexto global já marcado por conflitos na Ucrânia e no Oriente Médio.
Implicações
Com o novo documento, talvez se explique melhor o debate em Washington sobre a necessidade de modernizar e expandir as capacidades nucleares por meio do Project 25. A China está transformando sua força nuclear em um pilar chave de seu poder militar, integrando tecnologia avançada e expandindo seu arsenal a um ritmo alarmante para os americanos.
Esse desenvolvimento, juntamente com seu foco em superar as defesas americanas, reconfigura o panorama estratégico global, aproximando a nação asiática do nível de ameaça nuclear que, historicamente, apenas os EUA e a Rússia representavam. Além disso, essa modernização e expansão no mar representam um desafio direto ao domínio naval dos EUA, um pilar fundamental da ordem global desde a Segunda Guerra Mundial.
Com uma indústria de construção naval 200 vezes mais produtiva que a americana, segundo a Oficina de Inteligência Naval, a China acelera sua capacidade de projetar poder marítimo e disputar o controle estratégico de rotas-chave e territórios próximos aos EUA no futuro próximo. Em resumo, um relatório que parece abrir caminho para que a próxima administração amplie (ainda mais) os gastos com defesa.
Imagem | Steve Jurvetson, Philip McMaster
Este texto foi traduzido/adaptado do site Xataka Espanha.
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