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O computador mais poderoso da NASA acaba de detectar algo estranho: há uma estrutura espiral ao redor do Sistema Solar

Apesar da solidez do modelo, a confirmação dessa estrutura vai exigir observações diretas — um desafio monumental por conta da distância e do fraco reflexo de luz.

Computador da NASA detecta outro sistema Solar. Imagem: dolanh, NASA/ESA and A. Feild /Space Telescope Science Institute
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Sofia Bedeschi

Redatora

Jornalista com mais de 5 anos de experiência no ramo digital. Entusiasta pela cultura pop, games e claro: tecnologia, principalmente com novas experiências incluídas na rotina. 

A milhares de quilômetros do nosso planeta, há todo tipo de mistérios esperando para serem descobertos. Alguns conseguimos decifrar — como aquele estranho sinal de TV que levou anos para ser explicado —, mas outros seguem envoltos em um certo ar de mistério.

Nesse grupo cabe de tudo: desde magnetares de baixa intensidade até aquelas rajadas de rádio que detectamos de tempos em tempos. E, claro, tem também a Nuvem de Oort — uma região fascinante que acaba de nos revelar algo surpreendente.

Uma espiral nos confins

A borda do Sistema Solar sempre foi uma fronteira pouco explorada. Naturalmente, já que se trata de um território vasto e enigmático, cheio de objetos gelados que orbitam a distâncias extremas. É lá que fica a Nuvem de Oort, uma região que pode se estender até 100 mil unidades astronômicas (UA) do Sol. Por muito tempo, ela foi considerada apenas uma esfera de entulho cósmico — mas um estudo recente feito por simulação computacional colocou essa área no centro das atenções.

O motivo?

Foi identificada uma estrutura inesperada e fascinante: uma espiral semelhante a uma galáxia em miniatura.

A descoberta, liderada pelo astrônomo David Nesvorný, do Southwest Research Institute, e publicada no The Astrophysical Journal após circular no servidor de pré-publicação arXiv, mostra que a força gravitacional da Via Láctea moldou a Nuvem de Oort interna em uma estrutura espiral com cerca de 15 mil UA de diâmetro.

Essa espiral, que existe desde os primórdios do Sistema Solar, desafia as ideias anteriores sobre a forma da Nuvem de Oort — e pode mudar profundamente a forma como entendemos a evolução dos objetos transnetunianos.

A composição da Nuvem de Oort

Pelo que sabemos até agora, a Nuvem de Oort é tradicionalmente dividida em duas regiões. A Nuvem de Oort externa, localizada além das 10 mil unidades astronômicas (UA), é um esferoide formado por corpos gelados que têm uma ligação fraca com o Sol e sofrem perturbações gravitacionais frequentes causadas por estrelas próximas.

É dessa região que vêm a maioria dos cometas de longo período — aqueles que cruzam o Sistema Solar em trajetórias elípticas após serem desviados por interações gravitacionais.

Já a Nuvem de Oort interna está entre 1.000 e 10.000 UA, e até pouco tempo acreditava-se que tinha uma estrutura mais estável e em forma de disco. Por estar relativamente mais próxima do Sol, os objetos nessa zona estão mais fortemente ligados à sua gravidade e são menos suscetíveis a perturbações causadas por outras estrelas.

No entanto, novos modelos computacionais revelaram que sua forma não é um disco uniforme, e sim uma estrutura espiral, com braços retorcidos e um disco inclinado cerca de 30 graus em relação ao plano da eclíptica.

Original

A influência da Via Láctea

Ao que tudo indica, a chave para essa morfologia inesperada está na interação da Nuvem de Oort interna com o que se chama de “maré galáctica” — um fenômeno gravitacional gerado pela própria Via Láctea. Essa força, provocada pela atração gravitacional do centro galáctico, de estrelas próximas e até de possíveis buracos negros, afeta especialmente as regiões mais distantes do Sistema Solar.

O modelo desenvolvido por Nesvorný e sua equipe foi processado no supercomputador Pleiades, da NASA, usando dados sobre a formação do Sistema Solar há cerca de 4,6 bilhões de anos. Durante a simulação, os cientistas consideraram a influência gravitacional do Sol, o impacto da maré galáctica e a interação com a Via Láctea.

E os resultados?

A espiral teria se formado nos primeiros cem anos após a criação do Sistema Solar — e se manteve estável desde então, resistindo até mesmo à passagem próxima de estrelas ao longo dos últimos milênios.

Implicações e desafios da descoberta

Segundo os pesquisadores, um dos aspectos mais surpreendentes do estudo é que a espiral não se trata de um efeito temporário nem de uma perturbação recente, mas sim de uma estrutura permanente dentro da Nuvem de Oort interna. 

Comparações com estudos anteriores sugerem que essa forma já havia aparecido em diversas simulações passadas, embora só agora tenha sido reconhecida.

No entanto, como o próprio estudo destaca, confirmar essa estrutura por meio de observações diretas é um desafio monumental.

Os motivos?

A enorme distância e a baixa luminosidade dos objetos que compõem a Nuvem de Oort fazem com que até os telescópios mais avançados sejam incapazes de detectá-los diretamente. Na prática, a maior parte das evidências que temos sobre a Nuvem de Oort vem do estudo dos cometas de longo período — o que limita bastante a possibilidade de caracterizar com precisão sua estrutura interna.

Apesar dessas dificuldades, os cientistas consideram essa descoberta um passo essencial para entender a história do Sistema Solar. A estrutura espiral da Nuvem de Oort interna pode oferecer pistas sobre como se formaram e evoluíram os corpos gelados nas fronteiras do Sistema Solar — além de lançar luz sobre o impacto da Via Láctea em nossa vizinhança cósmica.

Um novo horizonte na exploração

Sem dúvida, a descoberta dessa estrutura espiral na Nuvem de Oort interna desafia a concepção tradicional da já enigmática fronteira do Sistema Solar, mostrando que a gravidade da Via Láctea teve um papel crucial em sua formação e evolução.

O achado também reforça a necessidade de desenvolver novos métodos de observação e missões espaciais voltadas para explorar as regiões mais distantes do Sistema Solar.

Além disso, fortalece uma ideia que já se intuía: a de que a Nuvem de Oort continua sendo uma fronteira inexplorada, um verdadeiro arquivo cósmico que guarda a história primitiva do nosso sistema. Como apontam os pesquisadores, seu estudo pode revelar informações-chave sobre a origem dos cometas, a dinâmica dos corpos transnetunianos e a interação do nosso sistema planetário com o ambiente galáctico ao redor. Quase nada.

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