Que um pequeno satélite falhe em órbita é algo bastante comum. Afinal, ele está constantemente exposto à radiação. Mas o fato de um estudante universitário decidir hackeá-lo, descobrir que o problema era, na verdade, de software e conseguir consertá-lo 12 anos depois... isso é épico.
Perdido
Em 2009, a Universidade Técnica de Berlim lançou um pequeno satélite chamado BEESAT-1. Dois anos depois, o controlador principal do satélite começou a enviar dados de telemetria incorretos. A troca para o controlador redundante resolveu temporariamente o problema, mas, depois de mais dois anos, ele também falhou.
Em 2013, o BEESAT-1 tornou-se praticamente inutilizável. Outros satélites da série BEESAT foram lançados desde então e encerraram sua vida útil ao queimarem na atmosfera. No entanto, o BEESAT-1 foi implantado em uma órbita mais alta, com um apogeu de 723 km, o que significa que ele continuará orbitando a Terra por pelo menos mais 20 anos.
Um Game Boy no espaço
Equipado com uma pequena câmera e uma roda de reação, o BEESAT-1 é um CubeSat 1U, um tipo de nanosatélite que mede 10 x 10 x 10 cm. Com dois microcontroladores ARM-7 de 60 MHz e 16 MB de memória, essa pequena nave tem poder de processamento comparável ao de um Game Boy.
As operações do BEESAT-1 foram encerradas há mais de uma década. A equipe nunca soube se o problema foi uma falha na configuração ou no próprio computador de bordo, já que a função de atualizar o software remotamente nunca foi implementada. Na verdade, vários sensores e atuadores do satélite nunca foram completamente testados, pois dependiam de uma atualização que nunca aconteceu.
Um desafio
Apesar do tempo, nem todos se esqueceram do BEESAT-1. Um estudante da TU Berlim, conhecido como PistonMiner, se obcecou pelo satélite devido à sua órbita mais alta, o que tornava o desafio de consertá-lo ainda mais interessante.
Lançado como carga secundária do foguete PSLV-CA C14, que colocou em órbita o satélite indiano Oceansat-2, o BEESAT-1 sobrevoa a Alemanha seis vezes por dia. No entanto, ele se desloca a 27.000 km/h, o que significa que, sendo otimistas, há uma janela de apenas 15 minutos para se comunicar com o satélite em cada passagem.
Um achado
Usando o transceptor ainda operacional de 4,8 kbps, PistonMiner descobriu que o satélite transmitia pacotes de telemetria vazios. Ao analisar a estrutura desses pacotes, percebeu que certos valores apareciam como se tivessem sido sobrescritos ou definidos no valor máximo.
Embora a hipótese inicial para a falha do satélite fosse danos causados pela radiação, algo comum em órbita, o jovem hacker verificou que o problema era, na verdade, uma falha de configuração. Provavelmente, um reset durante a gravação da memória flash corrompeu a área onde são armazenados parâmetros críticos do código, impedindo a geração de dados úteis.

Trabalho minucioso
PistonMiner pesquisou antigos repositórios e entrou em contato com ex-integrantes do projeto, mas conseguiu recuperar apenas parte do código-fonte do satélite. Com isso, precisou desmontar e reanalisar manualmente diversas funções para entender seu funcionamento.
O satélite armazena tanto o firmware quanto as páginas de configuração com parâmetros na memória flash. Isso significa que, para modificar um único bit de 0 para 1, era necessário apagar a página inteira e reprogramá-la.
Por esse motivo, PistonMiner criou uma espécie de "Frankenstein" utilizando outros CubeSats, como o BEESAT-9, para simular da forma mais precisa possível o funcionamento do BEESAT-1.
Uma solução
O estudante alemão aproveitou um comando que permitia modificar temporariamente o intervalo de geração de telemetria para verificar se o satélite ainda respondia. Ao alterar esse parâmetro, o BEESAT-1 voltou a enviar dados telemétricos.
O verdadeiro feito veio depois: como o satélite não tinha um sistema de atualização de software, PistonMiner desenvolveu patches para interceptar certos comandos e adicionar novas funções. Ele conseguiu gravar na memória corretamente e restaurou a telemetria completa dos sensores e do sistema de energia. Até mesmo recuperou imagens da câmera. O hacker trouxe o satélite de volta à vida.
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