Aconteceu em uma manhã de quinta-feira, em dezembro, na Europa. Durante algumas horas, o mundo prendeu a respiração pensando que, finalmente, Putin havia "apertado o botão". A força aérea da Ucrânia afirmou que a Rússia havia disparado um míssil balístico intercontinental (ICBM) de longo alcance contra Dnipro. No entanto, tudo se resumiu a um alerta na forma de um "míssil experimental". Pode-se dizer que foi também uma mensagem ao Ocidente, utilizando uma arma inédita cujo alcance foi o elemento-chave.
O alerta russo
O presidente Vladimir Putin anunciou, horas após o lançamento, que se tratava de um novo míssil chamado "Oreshnik", uma arma experimental equipada com uma ogiva hipersônica não nuclear, capaz de atingir uma velocidade de Mach 10.
Em sua primeira utilização em combate, o míssil atingiu um alvo militar-industrial na cidade ucraniana de Dnipro, descrito como um ataque de teste e uma clara mensagem de advertência ao Ocidente.
Desde então, analistas e especialistas ofereceram mais contexto sobre o ocorrido e a identidade do míssil utilizado. O dispositivo usado no ataque aponta para um RS-26 Rubezh ou uma variante desse modelo.
Embora oficialmente descontinuado em 2018, o Pentágono sugere que o projeto foi parcialmente retomado. De qualquer forma, o ataque marcou um uso histórico e sem precedentes de um míssil balístico em combate, embora, vale destacar, de alcance intermediário (IRBM), utilizando uma versão convencional de uma arma originalmente projetada para transportar ogivas nucleares.
Características do míssil
O Oreshnik (ou RS-26 modificado) é classificado como um míssil balístico de alcance intermediário (IRBM), embora alguns analistas o considerem próximo de um míssil intercontinental (ICBM).
A arma pode carregar ogivas convencionais ou nucleares e, segundo especialistas, inclui um sistema MIRV (veículo de reentrada com alvos múltiplos e independentes), capaz de transportar várias ogivas. Com um alcance máximo de até 5.500 quilômetros, supera amplamente os mísseis usados até agora na guerra na Ucrânia.
Desenvolvido a partir de 2008 pelo Instituto de Tecnologia Térmica de Moscou, sabe-se que o RS-26 é um míssil balístico de combustível sólido, móvel e de alcance intermediário (IRBM). Derivado do RS-24 Yars, ele mede aproximadamente 12 metros de comprimento e tem um diâmetro próximo de 1,8 metro.
Embora em testes tenha atingido alcances intercontinentais, isso só foi possível com cargas leves, o que limitou seu uso a alcances intermediários com ogivas nucleares ou convencionais.
O lançamento
O ataque na Ucrânia foi realizado a partir de Kapustin Yar, cerca de 800 quilômetros do alvo. Imagens do impacto sugerem o uso de múltiplas ogivas reentrantes independentes (MIRV), possivelmente combinando explosivos menores, contramedidas ou até versões sem carga letal.
Esse ataque, como mencionamos, pode ter servido tanto como um teste experimental quanto como um ato de dissuasão estratégica diante da OTAN. Sem dúvida, o uso de um IRBM convencional sinaliza uma tentativa da Rússia de demonstrar sua capacidade de driblar as defesas aéreas ucranianas enquanto envia uma mensagem de força ao Ocidente.
Os quilômetros-chave
O Kremlin sugeriu que o RS-26 poderia, na verdade, ser classificado como um ICBM, ou seja, um míssil capaz de atingir alvos a mais de 5.500 km de distância.
Mas, então, qual a questão?
A discrepância surge de um ponto importante: é de conhecimento público que a Rússia tentou manter-se dentro dos limites do Tratado de Forças Nucleares de Alcance Intermediário (INF), um acordo de 1987 que proibia o uso de mísseis balísticos e de cruzeiro com alcances entre 500 e 5.500 km. O objetivo era reduzir as tensões na Europa.
O que aconteceu?
Com a possibilidade de violar o INF, a Rússia anunciou oficialmente em 2018 que interromperia o desenvolvimento do RS-26. No entanto, o tratado foi encerrado em 2019, abrindo caminho, possivelmente, para novos avanços desde então.
Por isso, analistas acreditam que o exército ucraniano tenha inicialmente mencionado que o míssil usado em Dnipro poderia ser um ICBM. Com o passar das horas, ficou claro que esses "quilômetros a mais" não configuravam um ICBM, mas sim um IRBM. Essa distinção foi crucial para evitar uma nova escalada no conflito.
Implicações estratégicas e o futuro do RS-26
O que parece claro com esse aparente ressurgimento do RS-26 é uma tendência ao desenvolvimento de armas estratégicas não nucleares, capazes de enviar sinais de poder sem provocar uma escalada nuclear imediata. Como mencionado, o ataque também revela o risco de mal-entendidos por parte da Ucrânia ou da OTAN, já que mísseis dessa classe podem, potencialmente, carregar ogivas nucleares.
À medida que mais evidências forem coletadas, será necessário determinar se o Oreshnik é uma reativação direta do RS-26 ou um desenvolvimento completamente novo inspirado nesse sistema. De qualquer forma, a Rússia introduziu um novo nível de complexidade na guerra na Ucrânia e na dinâmica de dissuasão global: mísseis estratégicos projetados para exercer pressão política e militar.
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