Como o Japão desperdiçou 8 bilhões de dólares na única indústria que jamais conseguiu dominar: o Mitsubishi SpaceJet

Japão perde fortuna na indústria aérea. Imagem: Bridgestone Japan.
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Sofia Bedeschi

Redatora

Jornalista com mais de 5 anos de experiência no ramo digital. Entusiasta pela cultura pop, games e claro: tecnologia, principalmente com novas experiências incluídas na rotina. 

Em 2008, a Mitsubishi Heavy Industries anunciou sua intenção de entrar na indústria aeroespacial. Para isso, criou a Mitsubishi Aircraft Corporation (MAC), uma subsidiária lançada com um investimento inicial de 100 bilhões de ienes (mais de 14 bilhões de pesos).

O objetivo era desenvolver o Mitsubishi Regional Jet (MRJ), um avião que prometia revolucionar o mercado. A Toyota também participou do projeto, com uma participação de 10%.

A Mitsubishi contou ainda com o apoio do governo japonês, interessado em produzir aviões próprios para reduzir os custos das companhias aéreas do país. O Japão já tinha alguma experiência no setor com o NAMC YS-11, um turboélice que operou localmente entre 1962 e 1974.

Mas o MRJ era uma aposta mais ambiciosa: um jato moderno, eficiente e seguro, com potencial para competir no cenário internacional. No entanto, as coisas não saíram como o esperado.

A história de um fracasso

Quando a Mitsubishi apresentou o projeto com dois protótipos equipados com motores da Pratt & Whitney, prometeu que o avião estaria pronto em 2012. No entanto, o primeiro modelo só foi revelado em 2014.

E esse seria apenas o início de uma série de atrasos: após o primeiro voo do MRJ, realizado em novembro de 2015, a empresa anunciou que as primeiras entregas ocorreriam em 2017. Mas uma análise técnica do voo mudou completamente os planos.

O principal motivo foi a descoberta de falhas críticas pelos engenheiros: se o motor falhasse ou uma tubulação se rompesse, o sistema elétrico poderia entrar em colapso e provocar um incêndio.

Isso comprometeu diretamente a promessa de segurança e confiabilidade da aeronave, forçando novos adiamentos nas entregas — primeiro para 2018, depois para 2019.

Durante esse período, as normas de aviação nos Estados Unidos mudaram, o que obrigou a Mitsubishi a repensar diversos aspectos do projeto. No meio da pausa, a empresa rebatizou o programa como SpaceJet e adquiriu o programa CRJ da Bombardier, numa tentativa de economizar tempo e recursos para se adaptar às novas regulamentações.

Em 2019, ainda não havia sinal das 450 encomendas que haviam sido prometidas.

No ano seguinte, a pandemia de COVID-19 chegou — e com ela, o último prego no caixão do projeto. Por fim, a Mitsubishi decidiu cancelar o programa, que já havia consumido mais de 8 bilhões de dólares. A decisão ainda poupou 900 milhões que estavam comprometidos para as próximas fases de desenvolvimento, mas o Japão perdeu sua chance de se consolidar como um fabricante global de aviões comerciais.

Imagem | CHIYODA I / Wikimedia Commons. Imagem | CHIYODA I / Wikimedia Commons.

Um mercado sem espaço para os novatos

A verdade é que, se já é difícil consolidar uma marca no setor automotivo, fabricar aviões é um desafio ainda maior. Esse mercado é dominado por gigantes como Airbus e Boeing. Tudo que envolve aviação comercial exige investimentos altíssimos e o cumprimento de normas extremamente rigorosas.

Além disso, há a resistência natural das companhias aéreas em confiar em modelos novos — que, se falharem, podem trazer consequências graves, tanto econômicas quanto humanas.

Por isso, é muito difícil que uma nova marca consiga se estabelecer na indústria. Não por acaso, os principais países que buscam competir com Airbus e Boeing são potências como China, Brasil e Rússia, com empresas como COMAC, Embraer e UAC, respectivamente.

Esses países enxergam a aviação como uma peça estratégica dentro do tabuleiro geopolítico. Ter uma fabricante nacional forte permite não apenas reduzir custos internos para suas companhias aéreas, mas também conquistar espaço em um novo mercado e expandir sua área de influência.

No caso da China, isso ainda representa um passo importante rumo à autossuficiência industrial.

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