Em meados de 2024, Fu Linghai, um universitário da província de Hebei, no norte da China, viu seu rosto se tornar viral no país. Os vídeos, que se espalharam rapidamente pelas redes sociais e acabaram chegando a veículos como Global Times e China News Service, o mostravam na montanha, com óculos de sol e uma mochila nas costas, na qual ele transportava uma menina de três anos. Nada de estranho. Nem suspeito. Se Linghai se tornou tão popular da noite para o dia, foi porque, quando tiraram essa foto, ele estava exercendo uma profissão em ascensão no gigante asiático e bastante bem remunerada: a de pei pa.

Literalmente, ele era um "companheiro de escalada".
Parece exótico, mas o conceito é bem simples. Um pei pa é um "companheiro de escalada". E, neste caso, as palavras são muito importantes. Não estamos falando de um sherpa, nem de um guia, nem de um carregador, nem de um personal trainer. Não. Literal e estritamente, um "companheiro de escalada", alguém em boa forma física e com conhecimentos de montanha disposto a acompanhar os caminhantes que não querem subir as montanhas mais populares da China sozinhos e também não têm com quem ir.
E é um trabalho? Sim. Um tão peculiar que já chamou a atenção de veículos de imprensa nacionais e estrangeiros, incluindo a CNN e o First Post. Em uma sociedade em transformação como a chinesa, há pessoas (principalmente jovens universitários) em busca de uma renda extra e que encontraram um nicho de negócios particularmente lucrativo no acompanhamento de caminhantes.
Em troca de uma tarifa, esses pei pa estão dispostos a acompanhar montanhistas solitários ou sem experiência durante suas excursões, oferecendo-lhes seus conhecimentos, conversa e apoio físico, o que pode ser uma ajuda valiosa se o cliente quiser carregar mochilas ou crianças.
E quanto cobram?
Os pei pa geralmente oferecem seus serviços por meio de redes como Xiaohongshu ou Douyin, nas quais, entre outras coisas, informam sobre sua altura, condição física e experiência nas montanhas. As tarifas variam. A CNN estima que os "companheiros de escalada" costumam cobrar entre 200 e 600 yuans (R$ 157 a R$ 477) por viagem. Yu, por exemplo, cobra 200 yuans pelo serviço de acompanhamento e mais 50 adicionais se o cliente pedir que ele carregue uma mochila.
Subir e descer montanhas como o Monte Tai, com uma altitude superior a 1.500 metros, pode ser exaustivo, mas os pei pa que conseguem se popularizar são bem pagos. E, principalmente, permitem que os estudantes ganhem bem mais dinheiro do que com outros empregos temporários mais convencionais. Chris Zhang, um universitário de 20 anos, afirmou à CNN que arrecadou 2.800 dólares (R$ 16 mil) atuando como pei pa durante três meses. Isso é dez vezes mais do que alguns de seus colegas conseguiram com outros empregos.

Um trabalho fixo?
Nem todos os "acompanhantes" são universitários que querem aproveitar sua boa forma física e gosto por caminhadas para ganhar um dinheiro extra. Nas redes, também se encontram veteranos militares. E há quem, como Chen Wudi, de 27 anos, tenha decidido deixar seu emprego anterior para apostar tudo na montanha. Para ele, as coisas vão muito bem. Tem cerca de 40 reservas por mês e ganha 2.800 dólares (R$ 16 mil), bem acima do salário médio.
"Basicamente escalo montanhas todos os dias. Às vezes, duas ou até três vezes por dia", afirma à rede americana. Pode parecer exagero, mas a frequência com que se usam as hashtags relacionadas aos "companheiros de escalada" nas redes sociais chinesas mostra que o serviço tem gerado um interesse surpreendente no país.
Chen até se mudou para os pés do Monte Tai, embora assuma que não poderá continuar subindo e descendo as encostas no ritmo atual para sempre. "Meus joelhos doem muito. Talvez eu consiga continuar por mais alguns meses ou meio ano", disse.
E como é para os clientes?
O fenômeno dos pei pa se tornou tão popular que permitiu conhecer histórias tanto de "acompanhantes", quanto de "acompanhados". A mais popular de todas provavelmente é a de uma mulher da província de Shandong que se chama Li. Ela foi quem contratou, há meses, Fu Linghai, estudante de segundo ano de Educação Física, para subir o Monte Tai. Li queria viver a experiência com sua filha, de três anos, mas seu marido não pôde se juntar à expedição. O que ela fez? Procurou na internet até encontrar Fu.
Como o carregador de bebê com a menina pesava mais ou menos como uma mochila, o jovem se ofereceu para prestar o serviço por 518 euros (R$ 3.100), uma quantia que Li considerou razoável. A imagem do universitário carregando a pequena com agilidade e ritmo chamou a atenção das pessoas, e acabou sendo registrada em um vídeo. A magia das redes sociais chinesas fez o resto e seu caso chegou a veículos como China Daily, First Post, Global Times e à CNN.
O que exatamente eles fazem?
O caso de Fu é bem ilustrativo sobre o que faz um pei pa, embora alguns meios de comunicação falem sobre como eles também fazem companhia, assim como verdadeiros "companheiros" de escalada: conversam, cantam, contam piadas, animam, ajudam quando necessário... Wendy Chen, que não encontrou alguém para acompanhá-la até o topo do Tai, relata como seu acompanhante planejou a melhor rota, carregou sua mochila, alugou um casaco e tirou fotos para ela.
Tudo por 350 yuanes, ou R$ 282. Curiosamente, Chen sugere uma ideia: quanto mais bonito for o acompanhante, maior será seu preço. "A atração faz parte de sua força".
É um fenômeno estranho?
Não exatamente. O fenômeno dos pei pa pode ser melhor entendido à luz de outras duas tendências. Uma delas é a paixão pelos esportes ao ar livre na China e o interesse pelas montanhas. Recentemente, o Channel News Asia revelou como a demanda por "companheiros de escalada" estava aumentando durante as férias de outono e o Dia Nacional da República Popular, que ocorre em outubro.
O outro fenômeno é a peiban jingji, ou "economia do acompanhamento", que basicamente abrange negócios criados para acompanhar remuneradamente os clientes em certas circunstâncias, como durante jogos, compras ou atividades ao ar livre. De fato, alguns já associam o crescimento dessas atividades às mudanças sociais que o país está vivendo, com cada vez menos pessoas conseguindo se casar. Se as previsões estiverem corretas, 2024 terá sido o ano com menos casamentos desde 1980.
Há alguns meses, o Malay Mail afirmou que se prevê que o setor atinja um valor notável em 2025, e já há pessoas oferecendo serviços desse tipo por 33 dólares (R$ 190) por hora. "Além dos bens materiais, as pessoas buscam cada vez mais um consumo experiencial que melhore sua qualidade de vida", explica à CNA o doutor Zhao Litao, do Instituto de Ásia Oriental.
Imagens | Xiquinhosilva (Flickr) 1 e 2, Andrew and Annemarie (Flickr)
Este texto foi traduzido/adaptado do site Xataka Espanha.
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