Pablo Picasso, certa vez, declarou: “Em arte, procurar não significa nada. O que importa é encontrar”. O problema é quando você não encontra nada! E foi exatamente isso que aconteceu com o Museu Kunsten de Arte Moderna de Aalborg, na Dinamarca, que pagou uma nota ao artista plástico Jens Haaning para que criasse obras de arte conceituais. O que ele entregou? Duas telas em branco.
Foi assim: em 2021, o museu entregou a Haaning 534 mil coroas (R$ 461 mil) para criar versões atualizadas de duas obras que faziam parte de seu acervo. Tratavam-se, especificamente, de dois quadros cheios de cédulas — representando os salários anuais médios de um austríaco e de um dinamarquês — para uma exposição sobre o futuro do trabalho.
Em vez de recriar os quadros, o artista enviou ao museu duas telas em branco intituladas "Pegue o dinheiro e corra", sob o argumento de que havia criado peças novas e "melhores", que se encaixavam no tema da exposição.
O artista conceitual afirmou que sua obra era uma crítica aos baixos salários e que o descumprimento do contrato fazia parte da arte. "Não vejo que tenha roubado dinheiro... criei uma obra de arte que, talvez, seja dez ou cem vezes melhor do que havíamos planejado. Qual é o problema?", disse ele na época.
Brancos de pavor
Como seria de se esperar, o museu tentou levar Haaning à justiça. Após quase dois anos de litígio, o Tribunal Municipal de Copenhague acabou decidindo que o artista deveria devolver todo o dinheiro em 2023. A corte considerou que, independentemente da intenção das peças, a obra era "insuficiente" em relação ao que foi estabelecido no contrato com o Museu Kunsten, já que o artista havia concordado em entregar duas peças diferentes.
A decisão também rejeitou um recurso apresentado por Haaning, no qual ele alegava que o museu havia infringido os direitos autorais da obra. O tribunal decidiu contra o artista, determinando que ele permanecesse "obrigado" a devolver o dinheiro recebido (com exceção de 5.730 dólares em honorários de exibição) e a pagar os custos do processo judicial.
Golpe ou manifestação artística?
O artista sempre afirmou que recriar as obras lhe custaria apenas 25 mil coroas (R$ 18 mil) e que, por isso, decidiu enviar duas telas em branco. Ele acredita que sua ação não foi um roubo: "Incentivo outras pessoas que têm condições de trabalho tão miseráveis quanto as minhas a fazerem o mesmo. Se têm um trabalho de m**da e não são pagas, e ainda pedem que coloquem dinheiro do próprio bolso para trabalhar, então que peguem o que puderem".
O museu, que acabou exibindo as telas vazias de Haaning junto com uma cópia impressa de um e-mail no qual ele explicava suas ações, defendeu que nunca havia descumprido sua parte do acordo e que era conhecido por cumprir os contratos e pagar honorários razoáveis aos artistas. "Não somos um museu rico. Temos que pensar cuidadosamente em como gastamos nossos fundos e não gastar mais do que podemos nos permitir", afirmou o responsável pela instituição.
Uma corrente artística pitoresca
Há pouco mais de um século, Marcel Duchamp desafiou os limites do que poderia ser considerado arte quando pegou um mictório, girou-o em 90 graus, assinou com o pseudônimo "R. Mutt" e o enviou para a exposição inaugural da Sociedade de Artistas Independentes em Nova York. A arte conceitual continua a levantar polêmicas entre alguns críticos de arte e intelectuais ao redor do mundo, mas, ainda assim, muitos museus abraçam e exaltam esse tipo de obra como original e disruptiva.
As telas vazias de Haaning fazem parte de um gênero de obras controversas que questionam o valor da arte em si, como Maurizio Cattelan colando uma banana em uma parede e Banksy triturando um quadro em um leilão. Em 1958, o artista conceitual Yves Klein expôs uma sala vazia para milhares de pessoas. E, em 2016, o artista espanhol Karmelo Bermejo enterrou na rua os 10 mil euros que recebeu de um subsídio do governo.
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