A Europa precisa reduzir suas emissões de CO2. Nesse esforço, encontrou nas energias renováveis – especialmente eólica e fotovoltaica – seus aliados mais promissores. A questão é que mesmo os melhores aliados vêm com desafios e no caso da energia eólica há um enorme, que pode ser medido em quilômetros e toneladas: o que fazer com as milhares e milhares de pás de turbinas eólicas que serão "aposentadas" nos próximos anos, grandes pás feitas de fibra de vidro, carbono, resinas e outros compostos difíceis de reciclar?
Em Burgos, eles têm certeza de que a resposta é concreto. Para demonstrar isso, pavimentaram uma rua com um material que usa restos de moinhos.
Não diga pá, diga concreto
De forma muito resumida, essa é a ideia que o grupo de Pesquisa em Construção Sustentável (Sucons) da Universidade de Burgos teve e vem trabalhando há algum tempo. Consciente do enorme problema que está chegando ao setor eólico, que deve "aposentar" suas máquinas obsoletas, a equipe de Burgos decidiu buscar maneiras de reciclar componentes. Sua grande aposta é usar sobras das pás para fazer concreto.
Dessa forma, consegue um ganha-ganha ambiental. Primeiro, uma saída sustentável para os resíduos dos parques eólicos que começam a se acumular em enormes "depósitos de pás". Segundo, um concreto mais ecológico, o que não é uma questão menor se levarmos em conta que há relatórios que atribuem 7% de todas as emissões de CO2 de origem humana à indústria do cimento.
Duas palavras-chave: TPA e RCA
Elas podem não dizer muito, mas esses dois termos são a base do trabalho da Sucons. TPA é sigla para "Trituramento de Pás de Turbinas Eólicas" e RCA significa "Agregado de Concreto Reciclado". Ambos surgem dos resíduos deixados por instalações eólicas desmontadas e o que a equipe de Burgos pretende fazer é utilizá-los para a produção de concreto.
Assim, dizem, ele se torna mais sustentável e até ganha alguma resistência. "Verificamos e certificamos que o comportamento é muito semelhante ao do concreto convencional, mesmo com uma certa melhora na flexão e compressão", disse a equipe de pesquisa ao Diario de Burgos.
Em busca de uma segunda vida
O que a Sucons propõe é pegar as pás eólicas descartadas, cortá-las e triturá-las até obter o TPA, um insumo que pode então ser utilizado na produção de concreto. O mesmo com os restos deixados pelas antigas fundações dos moinhos uma vez desmontados. Há alguns meses, a Universidade de Burgos revelou que sua equipe já patenteou uma tecnologia que, destacou, "aproveita resíduos de pás, agregados de concreto reciclado e componentes tradicionais" para criar material de construção.
Do que é feito?
O TPA é composto por fibras de vidro, resinas poliméricas, espuma de poliuretano, madeira balsa e resinas de poliéster, materiais difíceis de reciclar e que tornam o gerenciamento de pás eólicas já removidas uma verdadeira dor de cabeça. Pelo menos se você não quiser que elas acabem empilhadas em aterros gigantescos, como em Wyoming, nos EUA, que ganhou fama em 2020 depois que um fotógrafo da Bloomberg o retratou com centenas de pás enormes empilhadas e enterradas.
O desafio é tão grande que nos últimos anos o setor recebeu propostas de todos os tipos para suas pás obsoletas, desde aproveitá-las para criar mobiliário urbano como marquises, bancos públicos ou pontes até mesmo tratar seus compostos para transformá-los em jujubas. Há também quem proponha repensar as próprias raquetes e utilizar materiais que se decomponham.
Por que esse esforço?
O fato de o setor estar tão atento ao que fazer com seus resíduos pode ser explicado por um único fato: a WindEurope estima que nos próximos anos cerca de 14 mil pás serão desmontadas na Europa, gerando entre 40 mil e 60 mil toneladas de resíduos. As estimativas podem variar, mas sempre apontam para o mesmo desafio: toneladas difíceis de reciclar.
Mais sustentável... e com um prêmio extra
O progresso da Universidade de Burgos é interessante por vários motivos. Ele oferece uma maneira de reutilizar os resíduos das pás, feitos com fibras, poliuretano e outros materiais que seus especialistas conseguiram "integrar efetivamente" ao concreto; mas a tecnologia da Sucons também tornaria possível melhorar o próprio material de construção.
Foi isso que eles fizeram em fevereiro: "Além de reduzir significativamente o aterro de resíduos e reduzir o consumo de recursos naturais, este material reciclado melhora a resistência à flexão do concreto, fornecendo uma solução sustentável e de alto desempenho para projetos de construção".
Da teoria…
À prática. É o que os pesquisadores fizeram em uma estrada em Burgos, perto do laboratório universitário onde trabalham. Lá, no Campus Milanera, eles pavimentaram um trecho de 50 metros de rua com seu concreto. Duzentos metros quadrados no total com os quais os especialistas querem dar um salto qualitativo e demonstrar a viabilidade real de sua proposta.
O trecho pavimentado da estrada é dividido em várias seções para que os pesquisadores possam avaliar o desempenho de seu material: uma é feita de concreto comum, outra incorpora 1,5% de componentes de pás de turbinas eólicas recicladas e outra eleva essa porcentagem para 3%.
Para seu teste ao ar livre, a equipe preferiu ser cautelosa e não exceder essa parte (3%), embora já tenha trabalhado com amostras de concreto que incluíam porcentagens muito maiores de pás recicladas. "Após realizar vários testes de laboratório nos quais incorporamos até 10% de TPA, na seção pavimentada, optamos por adicionar 3% de britagem com pá. Estávamos cientes de que amassar em grandes volumes é uma desvantagem significativa e por ser o primeiro teste em escala real não queríamos arriscar mais", explica Vanesa Ortega, diretora do grupo Sucons, ao El Periódico de España.
"Estamos no caminho certo"
No momento, a equipe parece satisfeita e garante que está no "caminho certo". "O pavimento de concreto está em perfeitas condições", comemora Ortega: "Agora resta ver a durabilidade a longo prazo." A estrada pavimentada com restos de pás suporta a passagem de carros, 70 por dia. "O momento da amassadura foi muito importante; também endureceu corretamente e os testes comprovam que tem bom comportamento mecânico. Ainda temos que saber sua durabilidade a longo prazo, mas parece bom."
Imagens | Universidade de Burgos e Waldemar (Unsplash)
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