Se você está lendo este texto fora do seu horário de trabalho e está tentando relaxar, já vou começar pedindo desculpas por citar o inominável. Vamos lá: você já parou para pensar em quão importante o Excel é no seu trabalho? Ou seja, se você pensar em uma jornada de trabalho de oito horas, quantas horas consistem em olhar para um abismo infinito de células, colunas e fórmulas? Quanto dependem a sua empresa e o seu salário de um Excel bem feito?
Mais ainda, o que aconteceria na sua empresa se amanhã Satya Nadella, CEO da Microsoft, perdesse completamente a cabeça e ordenasse a suspensão imediata do Excel, retirando o software do mercado? Seria algo interessante de assistir, você deve estar pensando, e não estaria errado. Mas o que sabemos é que há muito dinheiro dependendo dessas planilhas. E quando algo dá errado em um Excel, os resultados podem ser horríveis.
Talvez estejamos dependendo demais do Excel
O Excel está conosco há cerca de 40 anos. Foi em 1985 que a Microsoft lançou a primeira versão para Mac, mas, antes desse software tão importante para o futuro das empresas, houve outros. É possível que os mais velhos se lembrem de nomes como VisiCalc (para Apple II no final dos anos 70), Lotus 1-2-3 (sucessor dele e praticamente padrão nos computadores IBM) e Multiplan, da Microsoft, que foi a base do que, mais tarde, se tornaria o Excel.
O Lotus 1-2-3 era o programa e o Multiplan não conseguiu competir com ele no MS-DOS. No entanto, a chegada do Windows e seus PCs com interface gráfica e janelas, juntamente com o fato de que o Excel havia sido concebido desde o início para funcionar em um ambiente gráfico, fizeram com que, pouco a pouco, o Lotus caísse em desgraça e o Excel se tornasse o titã das planilhas que é hoje. A primeira versão foi lançada em 1985 para Mac e em 1987 para Windows 1.0.
O Excel se tornou o queridinho da Microsoft
O Word e o PowerPoint começaram a ser vendidos junto com o Excel em 1993, no que hoje conhecemos como Microsoft Office. O Excel era tão importante para a empresa que a Microsoft teve que atualizar as interfaces do Word e do PowerPoint para que fossem consistentes com as de seu software principal.

O Excel foi um sucesso desde o início, assim como o Windows. Foi uma situação perfeita para a Microsoft: o Windows tinha um ambiente gráfico, sua participação de mercado não parava de crescer, o Excel se adaptava perfeitamente a esse ambiente e, para completar, era a única opção disponível para o Windows na época. A Lotus Development, da IBM, ficou presa ao OS/2 e demorou demais para se adaptar aos novos tempos. Finalmente, em julho de 2011, a IBM acabou doando o código-fonte para a Fundação Apache para seu projeto OpenOffice.
O triunfo das planilhas
As planilhas tinham, e têm, uma vantagem enorme, que é o fato de que, quando você as domina e compreende, elas são capazes de substituir praticamente qualquer programa. Para que você teria um programa de contabilidade, outro para controlar o estoque e outro para [inserir qualquer finalidade] quando você pode fazer tudo com uma planilha do Excel, algumas fórmulas e macros? Estamos falando de um software que, em seu lançamento, era utilizável por todos os usuários, mais intuitivo que seus concorrentes e permitia armazenar, analisar, representar e acessar informações em tempo recorde.
As planilhas eram luz na escuridão, ordem no caos da imensa quantidade de dados que a humanidade gera, não em dias, mas em horas ou minutos. Mas, como tudo nesta vida, o que é bom sempre tem seu lado negativo.
O problema é quando se abusa do Excel
O Excel é muito versátil, mas talvez não seja a melhor ferramenta para fazer tudo. Sim, todos nós já tivemos um chefe que adorava uma planilha do Excel mais do que uma criança ama um doce, mas a realidade é que essa dependência provoca falhas. Softwares especializados existem justamente para focar em funções específicas que, em outros programas, como o Excel, são gerais. Por exemplo, no Excel você poderia perfeitamente registrar sua jornada de trabalho, mas é melhor usar um software dedicado para não acabar enviando o registro de um ano inteiro para o espaço porque deletamos uma planilha sem querer.
Dizer que a economia mundial depende de uma planilha do Excel onde os dados são inseridos manualmente talvez seja um exagero, mas já houve casos em que um dado errado em uma planilha causou perdas milionárias. Um dos exemplos mais conhecidos é o do J.P. Morgan Chase, conhecido como caso London Whale.

Em 2012, a empresa estava desenvolvendo um modelo VaR (Value at Risk) que se sustentava em um Excel no qual era necessário inserir dados manualmente, além de copiar e colar de outras planilhas. O funcionário encarregado disso, que não tinha formação no desenvolvimento de modelos, cometeu um erro: copiou e colou a soma de dois números em vez da média deles. Isso causou uma bola de neve que levou o JP Morgan a fazer investimentos mais arriscados do que o ideal e perder 6 bilhões de dólares.
Mas tem mais. Carmen Renhart e Kenneth Rogoff, da Universidade de Harvard, publicaram um estudo em 2010 intitulado "Growth in a Time of Debt" ("Crescimento em Tempos de Dívida"). Esse estudo afirmava que os países cujo déficit superasse 90% de seu PIB cresciam mais lentamente do que outras nações, um argumento usado para sustentar as políticas de austeridade implementadas após a crise de 2008. No entanto, houve um erro gigantesco que foi descoberto por um estudante, Thomas Herndon, que não conseguiu reproduzir os resultados.
Ao revisar o estudo, Thomas descobriu que os autores, que usaram o Excel para analisar os resultados, deixaram de fora do cálculo alguns países: Austrália, Áustria, Bélgica, Canadá e Dinamarca. Além disso, usaram uma média simples, em vez de ponderar os dados pelo tamanho das economias. No fim das contas, os dados estavam errados, mas serviram de base para algumas duras políticas de austeridade implementadas em países do sul, como Espanha, Portugal e Grécia. A tese até fazia sentido, mas as medidas adotadas poderiam ter sido mais brandas.

Esses são apenas dois casos notórios, mas não são os únicos. Aliás, existe um grupo chamado EuSpRiG (European Spreadsheet Risk Interest Group), cujo objetivo é, textualmente, "fornecer um fórum onde a pesquisa sobre os riscos empresariais e de auditoria derivados do uso de planilhas e as formas de evitá-los e combatê-los possam ser comparadas e apresentadas de maneira adequada para auditores e gestores empresariais".
A dependência do Excel
O problema não é o Excel em si, mas o mau uso ou, melhor dizendo, o uso inadequado da ferramenta. O Excel, como programa, é um software para armazenar, analisar e visualizar dados, não para criar nele um segundo cérebro a partir do qual tomar decisões importantes. O motivo é simples: 94% das planilhas do Excel contêm erros.
Se um dado errado inserido manualmente se encadeia com outro dado, que é adicionado a uma fórmula, gerando um resultado, que aciona uma macro, gerando o dado final sobre o qual se toma uma decisão, o resultado pode ser desastroso. Quanto maior for uma planilha, maior é o risco de haver um erro e mais difícil se torna encontrar a origem desse erro. De novo, e para variar, o elo mais fraco é o mesmo que em cibersegurança: o ser humano.
Qual seria a solução? Uma mudança nos processos. O Excel é bom para inserir dados e organizá-los, mas, na hora de processá-los, especialmente se for para tomar decisões, talvez seja mais interessante transferi-los para uma ferramenta dedicada com formatos padronizados que, além disso, permita a colaboração em tempo real e a atualização das informações. Porém, se há algo mais complicado do que dominar o Excel, é mudar aquele processo "que sempre foi feito assim" dentro de uma empresa.
Outra opção seria estabelecer um processo de revisão das planilhas de Excel, de modo que os arquivos sejam auditados periodicamente para garantir que não haja erros. Uma espécie de controle de qualidade do Excel, se preferir.
Imagem de capa | Xataka
Este texto foi traduzido/adaptado do site Xataka Espanha.
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