O telescópio Webb observou o buraco negro no centro da Via Láctea; ele descobriu um show de luzes caótico

É caracterizado por um piscar constante, intercalado com uma série de explosões intensas — como luzes de uma bola de discoteca — que parecem ocorrer de forma aleatória.

Telescópio Webb encontra novas luzes. Imagem: NASA, ESA, CSA, Ralf Crawford (STScI)
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Sofia Bedeschi

Redatora

Jornalista com mais de 5 anos de experiência no ramo digital. Entusiasta pela cultura pop, games e claro: tecnologia, principalmente com novas experiências incluídas na rotina. 

Três anos atrás, vimos pela primeira vez o buraco negro supermassivo que habita o centro da nossa galáxia. Agora, o telescópio espacial James Webb nos abriu uma janela para estudar o ambiente ao seu redor — e o que se revelou foi um espetáculo caótico de luzes que nunca para.

Contexto

No coração da Via Láctea está um enorme buraco negro chamado Sagitário A*. Astrônomos conseguiram desvendar a dinâmica extrema de seu disco de acreção — a espiral de gás e poeira que gira ao redor dele. Para isso, observaram a região por 48 horas (em períodos distribuídos entre 2023 e 2024), usando o instrumento NIRCam do telescópio Webb.

Uma bola de discoteca cósmica

As observações revelaram que Sagitário A* emite um verdadeiro show de luzes e brilhos, marcado por um piscar constante intercalado com intensas explosões de brilho.

Essas emissões têm dois componentes: um fraco e contínuo — provavelmente causado por turbulências internas no disco de acreção — e outro forte e de curta duração, associado a erupções intensas provocadas por reconexão magnética, quando campos magnéticos colidem e liberam enormes quantidades de energia. Essas variações podem acontecer em questão de segundos ou se estender por dias, semanas e até meses.

O que explica esse comportamento?

O estudo dessas emissões variáveis, publicado na The Astrophysical Journal Letters, sugere que as flutuações se intensificam conforme a escala aumenta. Segundo os pesquisadores, pequenas perturbações no interior do disco — ligadas a variações de densidade e campo magnético — geram os brilhos mais sutis. Já as grandes explosões seriam causadas por eventos pontuais de reconexão magnética, semelhantes às erupções solares, mas em uma escala energética muito mais intensa.

"Nos nossos dados, observamos uma luminosidade em constante mudança", explica Farhad Yusef-Zadeh, autor principal do estudo. "De repente, boom! Uma grande explosão de brilho aparece do nada e depois se acalma, sem seguir nenhum padrão fixo." Esse comportamento aparentemente aleatório mostra que o disco de acreção está sempre se renovando, com cerca de cinco a seis grandes erupções por dia — além de vários surtos menores.

Defasagens reveladoras

Uma das vantagens do instrumento NIRCam, do telescópio Webb, é sua capacidade de observar simultaneamente duas faixas de luz infravermelha (2,1 e 4,8 micrômetros). Isso permitiu aos cientistas comparar como o brilho das explosões variava em cada comprimento de onda.

O que surpreendeu foi a descoberta de um atraso entre os dois registros: os eventos na faixa mais curta mudavam de brilho um pouco antes dos da faixa mais longa. “É a primeira vez que observamos esse tipo de atraso nessas medições”, destacou Yusef-Zadeh. “Percebemos que a onda mais longa se atrasa entre três e 40 segundos.”

Esse detalhe é uma pista importante: indica que as partículas energéticas vão perdendo energia à medida que esfriam — um processo conhecido como resfriamento por sincrotron.

Novas observações a caminho

Agora, os pesquisadores planejam realizar uma nova campanha de observação contínua de até 24 horas de Sagitário A*, usando novamente o telescópio espacial James Webb. O objetivo é entender melhor se as erupções seguem algum tipo de padrão repetitivo — ou se são, de fato, totalmente aleatórias.

Cada brilho, cada piscar no disco de acreção do buraco negro supermassivo revela mais sobre a física que acontece nas proximidades do horizonte de eventos — um dos ambientes mais extremos de todo o universo.

Em outras palavras, esses dados nos ajudam a compreender como o espaço-tempo e a matéria se comportam sob a influência de uma gravidade tão intensa que desafia até as leis conhecidas da física.

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