Tendências do dia

‘O Brutalista’ era o grande candidato a arrebatar o Oscar deste ano; até que alguém atacou a IA

Filme usou ferramenta Respeecher para retocar alguns diálogos em húngaro

Uso de IA na pós-produção no centro da polêmica
Sem comentários Facebook Twitter Flipboard E-mail
pedro-mota

PH Mota

Redator

Jornalista há 15 anos, teve uma infância analógica cada vez mais conquistada pelos charmes das novas tecnologias. Do videocassete ao streaming, do Windows 3.1 aos celulares cada vez menores.

No momento mais inapropriado, às vésperas de sua estreia internacional e pouco antes do anúncio das indicações ao Oscar, uma polêmica salpicou a atuação impecável que 'O Brutalista' vinha tendo até então. O filme narra uma jornada gigantesca pela vida do arquiteto László Toth, que chega aos Estados Unidos para reconstruir sua carreira fugindo da Europa do pós-guerra. O uso de inteligência artificial na pós-produção do filme está no centro da polêmica.

Dois atos e um intervalo

O curioso é que a discussão é gerada por um filme absolutamente dedicado à memória do cinema clássico: é rodado em VistaVision, formato que não era usado desde 'The Impenetrable Face' em 1961, dura três horas e meia e é dividido em dois atos separados por um intervalo. Tanto classicismo está sendo recompensado nas cerimônias de premiação: Leão de Prata de Melhor Diretor em Veneza, três Globos de Ouro (Melhor Filme Dramático, Melhor Ator em Drama e Melhor Diretor) e nove indicações ao BAFTA. A sombra da IA ​​ameaça manchar um currículo tão limpo.

O uso da IA

Neste caso, a IA foi usada para duas questões. Por um lado, Midjourney foi usado para projetar os edifícios que aparecem na sequência final do filme, quando na Bienal de Veneza eles fazem uma retrospectiva do trabalho do protagonista. Esses edifícios foram baseados em desenhos feitos com IA, que um artista mais tarde reinterpretou para o filme. Mais tarde, o diretor do filme negou que esse uso da IA ​​seja real e o descartou como um boato originado por declarações do editor Dávid Jancsó. Mais controverso é o uso do Respeecher, um programa de IA vocal que melhorou os sotaques de Adrian Brody e Felicity Jones, que interpretam dois imigrantes húngaros. Brody fala húngaro fluentemente, mas seu sotaque não passou pelo de um nativo, então sua voz foi aperfeiçoada com IA.

Os limites da interpretação

A primeira escolha do diretor foi dublar os diálogos, mas vendo que o sotaque poderia ser melhorado ainda mais, ele optou pela IA com a permissão dos dois atores. A questão é: essa decisão pode custar o Oscar a Brody? É ético? Faz sentido premiar uma performance que não foi 100% humana?

Ferramenta ou intervenção

O diretor do filme foi rápido em esclarecer que os ajustes afetam apenas os diálogos em húngaro, para "refinar certas vogais e letras em busca de maior precisão". Não é o único filme deste ano que usou Reespecher: 'Emilia Pérez' misturou a voz de Karla Sofía Gascón com a da artista francesa Camille para expandir o alcance vocal da atriz nos números musicais. Um dos usos é defensável (ajustar nuances mínimas no sotaque de uma língua não majoritária) e outro não (enriquecer artificialmente as habilidades de canto do protagonista de um musical)?

Reivindicações justas

Vale lembrar que uma das demandas de atores e roteiristas nas recentes greves que paralisaram Hollywood por meses girava em torno do uso indiscriminado de IA, e foram firmados acordos que protegiam, sobretudo, o direito à imagem dos intérpretes e os direitos autorais dos roteiristas. À medida que as IAs se sofisticam, a indústria cinematográfica deve modificar seus acordos para não infringir os direitos dos artistas (lembre-se que em 'O Brutalista', a IA foi usada com a permissão dos atores) e estabelecer os limites onde termina a ferramenta e começa o abuso das produtoras.

Inicio