Em dezembro, soube-se que os Estados Unidos realizaram um teste curioso. Em essência, dispararam um míssil contra si mesmos para verificar se seriam capazes de neutralizá-lo. Esse raro teste ocorreu em um território não incorporado da nação, na ilha de Guam. Um enclave estratégico no Pacífico, cuja localização geográfica o torna um alvo "nuclear". E, se Guam não der os resultados esperados, agora sabemos que há um plano B pronto.
Renascimento estratégico
A empresa norte-americana Planet Labs, que realiza o monitoramento das mudanças e evoluções ao redor do planeta por meio de satélites, compilou uma série de imagens que não deixam dúvidas e que vão de dezembro de 2023 até janeiro deste ano. A base North Field, na ilha de Tinian, foi completamente reabilitada após permanecer abandonada por mais de 75 anos.
Originalmente construído durante a Segunda Guerra Mundial para lançar os trágicos bombardeiros B-29 sobre o Japão, incluindo as missões que levaram as bombas atômicas a Hiroshima e Nagasaki, o aeródromo aponta claramente para uma reconstrução com o objetivo de se tornar uma peça chave na estratégia militar dos Estados Unidos na região do Indo-Pacífico.
As imagens obtidas mostram o progresso completo na restauração de 2.000 metros quadrados de pistas, ruas de rolamento e outras infraestruturas chave. O design em forma de grade, inspirado em Manhattan, Nova York, complica os ataques inimigos ao distribuir os ativos estratégicos em um padrão difícil de neutralizar com um único golpe.
Tinian: um nó estratégico
Tinian, atualmente parte do Commonwealth das Ilhas Marianas do Norte, está a cerca de 200 km a nordeste de Guam, o que a torna um ponto estratégico para apoiar as operações aéreas dos Estados Unidos no Pacífico. De fato, como explicado no início, com a modernização do seu aeroporto, o Tinian International, e a expansão das suas instalações, a ilha agora oferece uma alternativa viável caso a Base Andersen em Guam seja atacada ou inutilizada.
Há vários projetos em andamento que incluem a ampliação de pistas e ruas de rolamento, novos depósitos de combustível no porto principal da ilha, a construção de uma grande plataforma de estacionamento para aeronaves e a modernização da infraestrutura para operações militares conjuntas entre a Marinha e a Força Aérea dos Estados Unidos.

Não estamos falando de um lugar qualquer, claro. Durante a Segunda Guerra Mundial, o North Field foi a maior base aérea do mundo, com quatro pistas de quase 3 km de comprimento, espaço suficiente para abrigar mais de 500 bombardeiros B-29 e uma equipe de 40.000 pessoas.
Após a guerra, a base foi abandonada em 1947 e permaneceu inativa por muito tempo. Nas décadas de 2000 e 2010, a Força Aérea realizou pequenos trabalhos para usar uma das suas pistas em exercícios de operações em terrenos austeros, mas foi somente em 2023 que se tomou a decisão de recuperar toda a base como parte da estratégia conhecida como Agile Combat Employment (ACE).
Agile Combat Employment: a dissuasão contra a China
A doutrina ACE se baseia na capacidade da Força Aérea de implementar forças de forma rápida e flexível em bases improvisadas ou remotas, reduzindo sua vulnerabilidade a ataques inimigos. A reabilitação do North Field faz parte desse plano, permitindo que aeronaves militares possam operar a partir de múltiplas localizações, em vez de depender de bases fixas como a Andersen em Guam, que seria um alvo prioritário em um conflito com a China.
Além disso, a Marinha e a Força Aérea implementaram medidas para dispersar e ocultar ativos estratégicos, dificultando o planejamento e a execução de ataques inimigos. A esse respeito, um recente relatório do Hudson Institute apontou que a China poderia inutilizar bases inteiras com apenas 10 mísseis carregados com submunições, o que torna fundamental a diversificação de aeródromos como Tinian para a sobrevivência operacional em um conflito de alta intensidade.
Reabilitação e bunkers
Enquanto outros países, incluindo a China, parecem estar fortalecendo suas bases com estruturas bunkerizadas, a Força Aérea dos Estados Unidos optou por uma estratégia diferente: não endurecer as bases, mas torná-las mais móveis e dispersas.
Dito isso, existe um debate no país sobre se essa estratégia é a mais adequada diante de um rival como a China, uma nação que desenvolveu um arsenal de mísseis de precisão capazes de atacar bases por toda a região do Indo-Pacífico.
Expansão de versatilidade. Essa é a última das vertentes que se entende após o avanço. A modernização do North Field também permitirá a operação de aeronaves com capacidades de decolagem e pouso vertical ou curto (STOVL), como o F-35B do Corpo de Fuzileiros Navais. Esse tipo de avião pode operar em pistas improvisadas e remotas, aumentando a capacidade de ataque flexível dos Estados Unidos na região.
Além disso, o uso de sistemas móveis de frenagem e catapultas eletromagnéticas (EMALS) em bases terrestres também está sendo avaliado, o que facilitaria a operação de aviões de combate em aeródromos com pistas mais curtas e sem infraestrutura fixa de porta-aviões.
Por tudo isso, a recuperação da base em Tinian representa, a priori, uma peça chave na nova arquitetura militar de Washington no Pacífico. Sua reabilitação oferece maior flexibilidade operacional, um possível plano B para Guam e complica a capacidade de ataque inimigo enquanto reforça a estratégia de dispersão de ativos na região.
Imagem | Planet Labs
Este texto foi traduzido/adaptado do site Xataka Espanha.
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