Em 2020, Donald Trump era um dos defensores da proibição do TikTok em solo americano devido ao risco de que os dados de seus cidadãos caíssem nas mãos da China. No entanto, a situação mudou e, curiosamente, o algoz do TikTok em 2020 tornou-se seu salvador em 2025. Seu argumento: a liberdade de expressão. E é aí que Elon Musk entra em cena.
O impasse do TikTok
A Primeira Emenda da Constituição dos EUA defende a liberdade de expressão e religião sem interferência do governo. No entanto, esse princípio entrou em conflito direto com alguns decretos aprovados em estados como Montana, governado pelo Partido Republicano, e com a Lei HR7521, conhecida como Lei de Proteção dos Americanos contra Aplicativos Controlados por Adversários Estrangeiros, assinada pelo governo Biden. Essa lei proíbe que empresas estrangeiras coletem dados de usuários americanos e os armazenem fora do território dos EUA.
Por isso, a ByteDance, empresa-mãe do TikTok e de outros aplicativos como Marvel Snap e CapCut, não pode operar nos EUA sem estar associada a uma empresa americana. Algo que Trump já anunciou que pretende revisar durante seu mandato, suspendendo o veto ao aplicativo chinês.
A liberdade de expressão
Elon Musk, que se autoproclamou defensor da liberdade de expressão nos EUA desde que comprou a rede social X, já havia se manifestado contra a proibição do TikTok no país. "Na minha opinião, o TikTok não deveria ser proibido nos EUA, ainda que tal proibição pudesse beneficiar a plataforma X", declarou o bilionário em abril de 2024.
Meses depois, já com uma posição de influência mais consolidada, ele reformulou suas palavras ao responder a si mesmo: "Sou contra a proibição do TikTok há muito tempo porque vai contra a liberdade de expressão. Dito isso, a situação atual, em que o TikTok pode operar nos Estados Unidos, mas o X não pode operar na China, é desigual. Algo precisa mudar".
I have been against a TikTok ban for a long time, because it goes against freedom of speech.
— Elon Musk (@elonmusk) January 19, 2025
That said, the current situation where TikTok is allowed to operate in America, but 𝕏 is not allowed to operate in China is unbalanced.
Something needs to change. https://t.co/YVu2hkZEVZ
Prioridades legais
O bloqueio do TikTok não tem origem na liberdade de expressão ou na moderação de conteúdos da rede social, como sugere Elon Musk em suas declarações. A proibição foi imposta com base na segurança nacional dos EUA e na privacidade dos usuários, já que a plataforma permite que seus dados sejam armazenados em servidores de países considerados "inimigos". Ao suspender o bloqueio, Trump prioriza a liberdade de expressão, permitindo que a China continue coletando dados dos usuários do TikTok nos EUA.
Já a China tem outras prioridades. Conforme destacado pelo Financial Times, Elon Musk estaria propondo que, em troca da continuidade do TikTok nos EUA, o X pudesse operar na China sem precisar seguir as rígidas normas de censura do país.
A resposta da China
Mao Ning, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, respondeu a Elon Musk ao ser questionada pelo Financial Times, afirmando que "Pequim dá boas-vindas a qualquer empresa que cumpra suas leis” e que “os grupos chineses no exterior devem obedecer às leis locais".
Mao acrescentou que as empresas chinesas que atuam no exterior deveriam "decidir de forma independente" sobre operações financeiras e acordos, especificando que a decisão de vender ou dividir a operação nos EUA para continuar funcionando cabe exclusivamente à ByteDance, não ao governo chinês.
Um Elon Musk mais brando com a China
As exigências de Elon Musk sobre o bloqueio do X na China foram muito mais moderadas do que as feitas às autoridades da Europa, do Brasil e da Austrália, onde as legislações locais obrigam as plataformas a combater a disseminação de fake news e desinformação.
Ao contrário da postura beligerante adotada contra a Alemanha, o tom conciliador com as autoridades chinesas se deve ao papel de intermediário entre China e EUA que Elon Musk tem desempenhado nos últimos meses, chegando até a ser apontado como possível comprador da rede social. No entanto, essa informação foi rapidamente desmentida. Ainda assim, os contatos entre representantes do governo chinês e Elon Musk continuam.
A dependência da Tesla da China
A postura moderada de Elon Musk em sua solicitação à China também está relacionada ao conflito de interesses que enfrenta devido à influência chinesa sobre as vendas da Tesla.
Quase um quarto das vendas da Tesla no terceiro trimestre de 2024 foram na China, e sua fábrica em Xangai abastece exportações para outros países da Ásia. Isso faz com que a China desempenhe um papel estratégico para a empresa de Musk, tornando inviável qualquer confronto com os líderes chineses.
O vice-presidente chinês, Han Zheng, compareceu à posse de Donald Trump, algo inédito em cerimônias anteriores. Antes do evento, porém, o representante chinês se reuniu com Elon Musk.
"Han se encontrou com o CEO da Tesla, Elon Musk, e deu as boas-vindas às empresas americanas, incluindo a Tesla, para aproveitarem as oportunidades e compartilharem os frutos do desenvolvimento da China, contribuindo para fortalecer os laços econômicos e comerciais entre China e Estados Unidos. Musk afirmou que a Tesla está pronta para aprofundar investimentos e cooperação com a China e desempenhar um papel positivo na promoção das interações econômicas e comerciais entre os dois países", publicou a agência estatal chinesa Xinhua.
Imagem | Unsplash (Rubaitul Azad), Dvids
Este texto foi traduzido/adaptado do site Xataka Espanha.
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