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Guiana é a economia que mais cresce na América do Sul. Tanto que eliminou impostos e devolveu 2.000 dólares por família

Não há outro lugar no planeta onde o “ouro negro” tenha transformado tanto a economia de um país. Guiana se entregou completamente ao petróleo.

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Sofia Bedeschi

Redatora

Jornalista com mais de 5 anos de experiência no ramo digital. Entusiasta pela cultura pop, games e claro: tecnologia, principalmente com novas experiências incluídas na rotina. 

A nova “febre do ouro”, é como alguns chamam esse fenômeno, enquanto outra parte do mundo não sabe bem se ergue a sobrancelha com ceticismo ou se faz uma reverência.

Estamos falando, claro, do boom do “ouro negro” que vem sendo sentido em alguns países latino-americanos, com o petróleo literalmente inundando regiões e suas economias. Tudo isso em um momento em que metade do planeta parece caminhar para reduzir emissões de carbono, enquanto alguns países reivindicam o direito pleno de abraçar o petróleo. E nenhum deles com o mesmo impacto que um país pequeno, que está quebrando recordes.

Guiana

Estamos diante de um país sul-americano relativamente pequeno, com uma população em torno de 800 mil pessoas. Nesse território, o petróleo provocou uma verdadeira explosão econômica como em nenhum outro lugar.

A maior descoberta de petróleo em uma geração transformou a nação, que antes era uma das economias de pior desempenho da região, na economia de maior crescimento do mundo por dois anos consecutivos.

O crescimento foi tão impressionante que projeta-se que a nação caribenha produzirá mais petróleo per capita do que a Arábia Saudita ou o Kuwait até 2027, e está no caminho para ultrapassar a Venezuela como o segundo maior produtor de petróleo da América do Sul, atrás apenas do Brasil.

A economia do país cresceu 49,7% no primeiro semestre de 2024 (com o setor de petróleo representando 67% desse crescimento, naturalmente). O presidente Irfaan Ali elevou as previsões de crescimento anual de Guiana para 42,8%.

Eles têm tanta “riqueza” que chegou a hora de fazer política entre os cidadãos — em outras palavras, de falar sobre dinheiro e impostos.

Um bônus por família

O governo anunciou uma medida que será observada de perto: um programa que vai distribuir 2.000 dólares a cada lar, como forma de compartilhar a crescente riqueza gerada pelo petróleo “e aliviar os custos de vida”. Quem anunciou a iniciativa foi o presidente Mohamed Irfaan Ali, que afirmou que o objetivo é reduzir as desigualdades econômicas e melhorar a qualidade de vida da população.

E não é só isso!

O governo também eliminou mais de 200 impostos e taxas, incluindo aquelas sobre combustíveis, água e itens alimentares básicos, numa tentativa de “combater a inflação e aliviar as pressões econômicas”.

Impacto Econômico

O programa de distribuição de US$ 2.000 por família, equivalente a R$10 mil reais, abrangendo cerca de 264.000 lares, representa 1,5% do PIB nacional e 7,9% do fundo de recursos naturais do país.

Especialistas, como Nicolás Suarez, economista da S&P Global Market Intelligence, apontam que, embora a iniciativa vise melhorar o bem-estar das famílias e estimular o consumo privado, ela pode aumentar as pressões inflacionárias a longo prazo devido ao incremento do gasto público.

Para contextualizar, a inflação na Guiana subiu de 2,3% ao ano antes da pandemia para 3,3% em agosto deste ano, evidenciando os desafios econômicos que o país enfrenta.

Imagem de satélite da Guiana Imagem de satélite da Guiana

Distribuição de riquezas e conceito de renda universal

O pagamento desses 2.000 dólares por família foi bem recebido pelos defensores da renda básica universal, que veem na medida algumas semelhanças e um passo rumo a uma redistribuição mais justa da riqueza.

Ainda assim, não se trata de uma renda básica universal no sentido tradicional, pois é um pagamento único e não recorrente.

Para o especialista em filosofia Karl Widerquist, estamos diante de um “capital básico” ou um “subsídio de participação”, uma iniciativa importante para garantir que todos os cidadãos se beneficiem da riqueza nacional. Nesse sentido, Cleo Goodman, especialista em renda básica do Instituto de Autonomia, também elogia o esforço, embora ressalte que um ingresso garantido e recorrente seria uma solução mais completa para distribuir a riqueza recém-descoberta.

É o petróleo, amigos.

Não dá para entender essa história sem o marco da descoberta da Exxon, que encontrou vastas reservas de petróleo na costa da Guiana em 2015. Esse evento representou uma mudança radical para o país, que passou a vivenciar um crescimento econômico sem precedentes.

Como mencionamos no início, estima-se que a Guiana possa produzir 1,3 milhões de barris de petróleo por dia em 2027, colocando o país entre os 20 maiores produtores do mundo.

Daí vem o "monstruoso" crescimento do PIB da nação, que aumentou 62% em 2022 e 33% em 2023, e também o PIB per capita, que subiu de 7.000 dólares em 2020 para 26.000 dólares em 2023 — um reflexo claro do impacto positivo do boom do petróleo na economia do país.

Comparativo

Especialistas rapidamente apontaram para um exemplo de administração de recursos mais ou menos similar: a Noruega. Lá, o fundo soberano de petróleo é usado para estabilizar a economia e gerar poupança a longo prazo.

Com ativos superiores a 1,7 trilhão de dólares, o fundo norueguês é considerado um dos mais bem-sucedidos do mundo (não à toa, a Noruega é um dos países mais ricos, com um PIB per capita de 88.000 dólares).

A Guiana parece seguir um caminho semelhante, ao menos em seus primeiros passos, criando seu próprio fundo de recursos naturais em 2019 para gerenciar com prudência os lucros do petróleo e proteger sua economia da volatilidade dos preços da energia.

O futuro e os desafios

Sem dúvida, o futuro de curto prazo da Guiana parece relativamente garantido. Mas, como alertam os especialistas, persistem as preocupações com a inflação e a necessidade de uma abordagem mais abrangente e sustentável a longo prazo na gestão dessa riqueza.

O desafio será manter o equilíbrio entre desenvolvimento econômico e equidade — mas há mais. Espera-se que o Suriname passe por um impulso similar após a descoberta de grandes reservas de petróleo no chamado Bloco 52, e a febre do ouro negro não se limita ao Atlântico Norte: Argentina, Equador e Costa Rica também estão interessados em expandir suas indústrias petrolíferas.

Se a tão esperada "transição energética" acabar criando uma superoferta no mercado, o que acontecerá com esses locais e suas infraestruturas?

E o planeta?

Esta é a última questão a ser resolvida — embora certamente não menos importante. Refiro-me à forma como a Guiana e outros países que estão enriquecendo com o “ouro negro” vão alcançar os objetivos climáticos que o planeta tanto demanda.

Uma coisa parece clara: no momento, é razoável questionar seriamente qualquer uma dessas metas, pelo menos no curto prazo.

Imagens | amanderson2, FreeMalaysaToday, NASA

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