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De porta-aviões estrela da Marinha Espanhola a uma pilha de sucata: a história do Príncipe das Astúrias

  • O Príncipe de Astúrias foi baseado nos projetos de um porta-aviões norte-americano que nunca chegou a ser construído

  • Por décadas, foi o principal baluarte naval da Espanha, mas mantê-lo era absurdamente caro e atualizá-lo... ainda mais

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Sofia Bedeschi

Redatora

Jornalista com mais de 5 anos de experiência no ramo digital. Entusiasta pela cultura pop, games e claro: tecnologia, principalmente com novas experiências incluídas na rotina. 

Há quem questione a utilidade de um porta-aviões, mas a verdade é que as principais potências estão investindo pesado em seus novos navios. A China possui o moderno Fujian, a Índia tem o Vikrant, os Estados Unidos contam com o John F. Kennedy e até o Japão lançou seu primeiro porta-aviões desde a Segunda Guerra Mundial. Já a Espanha tem o Juan Carlos I, mas, por quase 25 anos, o símbolo da Armada Espanhola foi o Príncipe de Astúrias.

Hoje, o que já foi o orgulho da frota naval espanhola não passa de sucata que ninguém quis, nem mesmo a preço de liquidação.

O Príncipe de Astúrias

Na década de 1970, a Marinha dos Estados Unidos desenvolveu o conceito de um pequeno porta-aviões de escolta, projetado para oferecer apoio aéreo a comboios e realizar operações de guerra antissubmarina contra a União Soviética. Batizado inicialmente de Sea Control Ship (ou SCS), o projeto tinha um custo estimado de 630 milhões de dólares atuais, mas acabou cancelado devido a cortes no orçamento.

Os planos, no entanto, não foram esquecidos. A Espanha, que buscava desenvolver um porta-aviões "econômico", adquiriu o projeto. A ideia era criar um novo navio para substituir o veterano Dédalo.

Após alguns atrasos, ajustes no modelo e dificuldades no desenvolvimento, o Príncipe de Astúrias foi incorporado à Armada Espanhola em 1988, com um custo final de 105 bilhões de pesetas — cerca de 631 milhões de euros - ou 3.867.030.000 reais.

Ski-jump que podia com tudo

O Príncipe de Asturias foi construído em Ferrol pela Nacional Bazán — atualmente conhecida como Navantia — e, embora tenha sido baseado nos planos do SCS norte-americano, a Navantia defendeu que era um navio espanhol. "O que recebemos dos Estados Unidos foi um anteprojeto, uma ideia conceitual do navio, por isso o desenvolvimento é basicamente espanhol", comentaram da Navantia.

Esboço do SCS Esboço do SCS
O Príncipe de Astúrias O Príncipe de Astúrias

Realmente, era desse jeito!

Logo acima, podemos ver um design conceitual do SCS ao lado do Príncipe de Astúrias. Há elementos que diferem e, embora sejam similares em desempenho, o porta-aviões espanhol recebeu uma ski-jump, a clássica rampa de esquí presente em porta-aviões "curtos" antes da adoção do sistema de propulsão eletromagnética. O navio tinha 196 metros de comprimento, 24,3 metros de largura e um peso de 17.200 toneladas com carga total.

Uma capacidade gigante

Foi o maior navio da Armada Espanhola até a entrada em serviço do Juan Carlos I e tinha capacidade para aeronaves STOL, STOVL e VTOL. No total, podia carregar 29 aeronaves (12 na pista de decolagem e 17 no hangar). Sua frota usual incluía cerca de 12 AV-8 Harrier II, 12 helicópteros e aviões de alerta antecipado por radar. De 1988 a 2012, o Príncipe de Astúrias participou de conflitos como a Primeira Guerra do Golfo, até que a Armada decidiu aposentá-lo.

O porta-aviões em Ferrol, aguardando a transferência para a Turquia O porta-aviões em Ferrol, aguardando a transferência para a Turquia

A manutenção era um desastre

A ideia inicial era que o porta-aviões retomasse suas atividades no futuro, mas havia um problema: a manutenção era extremamente cara. Estima-se que seriam necessários 30 milhões de euros por ano para manter o navio, além da modernização de alguns sistemas e ajustes na célula de habitabilidade.

Já haviam sido investidos mais de 3,6 milhões de euros para melhorias nas áreas de descanso, lazer, banheiros e camarotes, mas isso não foi suficiente.

O custo do novo projeto de modernização estava estimado em cerca de 100 milhões de euros, algo inviável no auge da crise econômica. O navio estava obsoleto, e foi tomada a decisão de desmantelá-lo em Ferrol — uma decisão que gerou bastante polêmica. Contudo, ainda havia uma última esperança para o icônico porta-aviões.

A preço de "banana"

Atracado desde fevereiro de 2013 nos estaleiros de Ferrol, o Ministério da Defesa decidiu, em dezembro de 2015, leiloar o Príncipe de Astúrias. O preço inicial foi de 4,8 milhões de euros, com uma estratégia clara: caso o navio não fosse vendido em quatro leilões (com redução de 15% no preço a cada rodada), ele seria desmantelado definitivamente.

Ninguém fez ofertas, nem no primeiro leilão, nem nos três seguintes, quando o preço já havia caído para 2,9 milhões de euros.

Com o leilão declarado nulo, surgiu a empresa espanhola Surus Inversa em parceria com a turca Leyal, que ofereceu 2,7 milhões de euros. A ideia não era recuperar o navio, mas sim desmontá-lo e revender o metal reaproveitável como sucata.

Seu fim foi na Turquia

Assim, o imponente porta-aviões espanhol embarcou, em agosto de 2017, em sua última viagem, com destino ao porto de Aliaga. Este renomado estaleiro turco é o local onde centenas de embarcações, de todos os tipos, chegam para serem desmontadas.

Já falamos como é o trabalho em Aliaga e as controvérsias que cercam o local, mas, deixando isso de lado, o objetivo da Surus e da Leyal era recuperar os 8,5 milhões de quilos de metal reutilizável, dos quais mais de seis milhões eram aço.

Em 2018, o navio foi desmontado, encerrando assim a história de um marco histórico da Armada Espanhola. O Príncipe de Astúrias foi cenário do filme Navy Seals e possui um "irmão quase gêmeo": o Chakri Naruebet, o primeiro e único porta-aviões da Tailândia, construído em Ferrol com base no design do Príncipe de Astúrias.

Imagens| Raymond H. Turner II, Oilisab, Felix Stember, U.S. Navy

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