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Em seu plano para domesticar nuvens, Marrocos encontrou um inimigo inusitado: agricultores de Múrcia

O Marrocos está jogando compostos químicos nas nuvens para fazer chover, mas agricultores espanhóis temem que a técnica acabe roubando sua umidade

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Victor Bianchin

Redator

Victor Bianchin é jornalista.

Entre 2017 e 2021, o Marrocos realizou pelo menos 121 operações de semeadura de nuvens — uma técnica que consiste em jogar compostos químicos na atmosfera com aeronaves para estimular a formação de nuvens de chuva. Nos últimos tempos, o país tem apostado ainda mais alto nessa tecnologia: já são mais de 10 milhões de euros (R$ 60 milhões) por ano para fertilizar as nuvens (as frias com iodeto de prata e as quentes com cloreto de sódio). E tudo indica que não irão parar.

Estamos falando de uma tecnologia experimental, sem resultados garantidos. Mas, curiosamente, os mais preocupados com essa iniciativa não estão no Marrocos, e sim em Múrcia, uma cidade ao sul da Espanha.

Após as notícias recentes, os agricultores murcianos começaram a se preocupar com as consequências de todo esse movimento do outro lado do Estreito de Gibraltar, que separa as costas de Espanha e Marrocos. Principalmente porque essa região espanhola vem sofrendo com secas e ninguém tem muita certeza de quais serão as reais consequências de toda essa engenharia climática.

Dá mesmo pra fazer chover?

Essa é a grande pergunta. Diferentemente do que o nome "semear nuvens" pode sugerir, não se trata de fazer crescer nuvens do nada, nem de criá-las artificialmente, mas sim de "melhorar a capacidade de uma nuvem para produzir chuva ou neve."

As técnicas atuais utilizam catalisadores (como cristais de sal) para fazer com que as gotas de água presentes em uma nuvem se fundam em "gotas de chuva maiores e mais pesadas, que finalmente caem ao solo". Nesse sentido, "semear nuvens" significa monitorar regiões com umidade suficiente e ordenhá-las quimicamente.

Colocando dessa forma, a preocupação parece legítima: os murcianos temem que o Marrocos possa reter a umidade que, em outras condições, abasteceria as chuvas da região (ou da Espanha em geral).

Mas não sabemos nem se vai dar certo no próprio Marrocos. A princípio, encontrando nuvens que sejam boas candidatas, a técnica pode sim conseguir que a umidade interna se precipite. Mas a preocupação por lá é que a tecnologia ainda é muito cara: é preciso um enorme (e custoso) aparato técnico para obter resultados relativamente pobres.

Além disso, os rios voadores que atravessam o Marrocos e chegam à Espanha são escassos (e não representam uma parte significativa dos recursos hídricos dos ibéricos).

Mas a preocupação não termina aí

Para além da captura de umidade, o que preocupa os agricultores é não saber exatamente o que o Marrocos está fazendo. "Teremos que ficar muito atentos ao desenvolvimento dessas operações científicas que estão sendo realizadas em segredo, e que já foram feitas em alguns países que estão praticando essa técnica", explicou Juan de Dios Hernández, presidente da associação Asaja, ao jornal La Opinión de Murcia.

A questão é que não há legislação internacional suficiente sobre o assunto para garantir que esse tipo de geoengenharia não acabe afetando outras regiões além dos lugares desejados.

Como controlar esse tipo de tecnologia? Embora a engenharia climática promovida pelo Marrocos tenha um efeito relativamente limitado, a situação não vai parar por aí. Em poucos anos, teremos tecnologias capazes de modificar sensivelmente certos aspectos do clima. Isso vai exigir mais cooperação internacional para a criação de mecanismos de regulação adequados.

No fundo, esse é o problema com coisas que parecem ficção científica, mas que já estão virando realidade. É por isso que é interessante começar a colocar esses temas em discussão.

Este texto foi traduzido e adaptado do site Xataka Espanha

Imagem | Copernicus EU

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