Os humanos estão evoluindo vivos no Planalto Tibetano. E entender o que acontece lá será essencial no espaço

O mundo é um lugar muito mais estranho do que imaginávamos — e isso nos transforma também.

Evolução dos homens na Terra. Imagem: Will Pagel
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Sofia Bedeschi

Redatora

Jornalista com mais de 5 anos de experiência no ramo digital. Entusiasta pela cultura pop, games e claro: tecnologia, principalmente com novas experiências incluídas na rotina. 

Não é fácil respirar no topo do mundo. Dias atrás, Kilian Jornet contou no La Revuelta que, enquanto descia do Everest, começou a ter alucinações — e, convencido de que estava sonhando, quase se jogou no vazio. E faz sentido: a milhares de metros acima do nível do mar, simplesmente há menos oxigênio em cada inspiração. Podemos dizer que é pura física.

Ainda assim, por mais de 10 mil anos, os tibetanos não só sobreviveram às condições extremas daquele ambiente — eles prosperaram.

Mas como?

Essa é uma pergunta que intriga antropólogos há anos. E, se a gente parar para pensar, é algo curioso mesmo. Durante décadas, se repetiu que a evolução é lenta e que, em termos gerais, os seres humanos continuam praticamente os mesmos desde o paleolítico. Se isso é verdade, como os tibetanos (que são pessoas como nós) conseguiram prosperar todo esse tempo?

A resposta é simples: não sendo.

Há alguns meses, a antropóloga Cynthia Beall, da Case Western Reserve University, publicou uma pesquisa na revista PNAS que esclarece tudo isso e revela “como as características fisiológicas das mulheres tibetanas aumentam sua capacidade de reprodução em um ambiente com tamanha escassez de oxigênio”.

É a evolução acontecendo ao vivo.

O que eles fizeram? Beall e sua equipe estudaram 417 mulheres tibetanas com idades entre 46 e 86 anos, que vivem a cerca de 4.000 metros acima do nível do mar, na região de Alto Mustang, no Nepal — ou seja, na extremidade sul do planalto tibetano.

Eles reuniram uma grande quantidade de dados: desde o histórico reprodutivo dessas mulheres até medições fisiológicas, amostras de DNA e um amplo conjunto de fatores sociais.

O objetivo era justamente entender como as características relacionadas ao fornecimento de oxigênio em condições de hipóxia em grandes altitudes influenciam no número de nascimentos vivos. Por quê? Porque essa é uma medida chave da aptidão evolutiva dessas mulheres.

E foi exatamente isso que encontraram.

As mulheres que tiveram mais filhos vivos apresentavam um “conjunto único de características sanguíneas e cardíacas” que ajudavam seus corpos a distribuir o oxigênio de forma mais eficiente. Em especial, descobriram que, embora essas mulheres tivessem níveis médios de hemoglobina, ela estava mais saturada.

Essa era uma solução incrível, pois permitia uma distribuição eficaz de oxigênio sem aumentar a viscosidade do sangue (e, portanto, sem exigir um esforço extra do coração).

O que tudo isso significa?

Algo realmente fascinante. O estudo não apenas destaca “a notável resiliência das mulheres tibetanas”, como também oferece informações valiosas sobre as formas pelas quais os seres humanos podem se adaptar a ambientes extremos.

Afinal, “este é um caso de seleção natural em andamento. As mulheres tibetanas evoluíram de uma forma que equilibra as necessidades de oxigênio do corpo sem sobrecarregar o coração”, explicou Beall. E entender como populações como essa se adaptam “nos dá uma compreensão mais profunda dos processos da evolução humana”.

Algo que, por outro lado, a gente precisa encarar. Porque, no fim das contas, a unidade da espécie humana só se sustenta graças às condições ambientais parecidas nas quais vivemos. Mas... o que vai acontecer quando nos tornarmos uma “espécie interplanetária”?

A resposta é simples: nunca poderemos voltar para casa. A unidade da espécie será sacrificada em nome do sucesso adaptativo.

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