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Anote tudo para não precisar lembrar de nada: o paradoxo que está revolucionando a produtividade é baseado em lápis e papel

Se você não quer esquecer de nada, anote no seu caderno. E assim, você pode esquecer tranquilamente

Produtividade analógica tem ganhado espaço em organização de tarefas
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PH Mota

Redator

Jornalista há 15 anos, teve uma infância analógica cada vez mais conquistada pelos charmes das novas tecnologias. Do videocassete ao streaming, do Windows 3.1 aos celulares cada vez menores.

É, no mínimo, curioso que, em meio ao avanço da inteligência artificial e da digitalização, a mais recente tendência em produtividade seja uma agenda japonesa para anotar tudo o que não queremos esquecer.

Por anos, foram desenvolvidos aplicativos de produtividade como Trello e Asana, que praticamente automatizam a organização das tarefas, auxiliados por calendários extremamente eficientes que permitem aproveitar ao máximo cada minuto do dia. No entanto, são tão eficazes que acabam deixando pouco ou nenhum tempo para a reflexão.

Talvez seja esse o motivo do recente movimento em direção ao que alguns já chamam de "produtividade analógica" e, em um formato híbrido entre o analógico e o digital, de "produtividade artesanal", onde cada pessoa constrói seu próprio sistema do zero.

Nesse tipo de "faça você mesmo" da produtividade, a versatilidade de aplicativos como Notion, Obsidian ou até mesmo o aplicativo de notas do celular é utilizada para criar um sistema personalizado. Às vezes, menos é mais.

Anote tudo para poder esquecer

Um dos principais objetivos de anotar o que é importante é, justamente, não esquecê-lo. Nesse sentido, estudos científicos apresentam dois lados da mesma moeda.

Por um lado, escrever reduz a carga mental e, consequentemente, ajuda a diminuir os níveis de estresse. Michelle Eskritt e Sierra Ma, da Mount St. Vincent University, no Canadá, conduziram um experimento com estudantes universitários jogando um jogo de cartas chamado "Pair", no qual é preciso encontrar pares lembrando sua posição. Um grupo pôde anotar a localização das cartas, enquanto o outro teve que confiar apenas na memória.

Em determinado momento, os pesquisadores retiraram as anotações daqueles que puderam escrever e, surpreendentemente, seu desempenho foi muito pior do que o do grupo que confiou apenas na memória. Ou seja, o simples ato de anotar liberou o cérebro da necessidade de lembrar a informação. Se já estava escrito, por que memorizar?

Bulletjournal

Por outro lado, estudos científicos desenvolvidos pelas universidades de Princeton e UCLA constataram que o simples ato de escrever notas à mão envolve mecanismos cognitivos relacionados à memória e ao aprendizado.

Seguindo essa linha, pesquisas da Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia revelaram que o esforço motor ao desenhar palavras no papel ativa e fortalece esses mecanismos no cérebro.

Em outras palavras, anotar informações ajuda a assimilar conceitos e conhecimentos, fixando-os na memória de longo prazo. Ao mesmo tempo, proporciona ao cérebro um alívio, permitindo filtrar e descartar informações efêmeras, como compromissos e tarefas pendentes. Você não precisa gastar energia lembrando-se delas—basta abrir sua agenda ou aplicativo e tudo estará registrado.

Dessa ideia de anotar tudo o que acontece na vida, surgem duas abordagens interessantes. A primeira é o conceito de "segundo cérebro", que propõe registrar todas as ideias, informações e aprendizados conectando-os para formar uma base de conhecimento crescente. Um repositório personalizado de saberes.

Aqui entram em cena ferramentas digitais como Notion e Obsidian, que adotam um formato de Zettelkasten digital, conectando anotações de maneira semelhante a uma rede neural de conhecimento. Muitas pessoas se adaptam bem a esse sistema, que exige persistência e dedicação para gerar resultados no médio e longo prazo, mas ele não é para todos.

Insurgência analógica

O uso de ferramentas digitais, como Notion e Obsidian, requer uma curva de aprendizado, além do planejamento de uma estrutura adequada.

Por outro lado, a proposta da produtividade analógica se baseia em um princípio muito mais simples: papel e caneta. A barreira de entrada desse método é praticamente inexistente, mas ele pode evoluir para sistemas mais sofisticados, como o Bullet Journal.

Um dos fatores que impulsionam o crescimento desses sistemas analógicos é a saturação causada pelo excesso de telas e da vida digital.

Escrever à mão no papel exige atenção total. Funciona como uma forma de desconexão digital, afastando notificações, feeds infinitos que consomem tempo e a tendência de alternar entre vários aplicativos sem propósito definido.

Na verdade, podemos considerar essa tendência uma evolução do que aconteceu com a fotografia, a música e, agora, também com a produtividade. Mesmo entre aqueles que estão na vanguarda da tecnologia.

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