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Austrália executou 750 coalas com franco-atiradores em helicópteros "pelo bem dos animais"

Um incêndio florestal levou as autoridades a sacrificarem parte dos animais afetados - governo afirma que não havia alternativas, ativistas falam em “massacre”

Coalas abatidos com franco-atiradores: por que a Austrália está fazendo isso? / Imagens: Arctic Warrior (Flickr) e Nghia Nguyen (Unsplash)
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Victor Bianchin

Redator

Victor Bianchin é jornalista.

Os coalas são um dos símbolos mais reconhecíveis (e provavelmente queridos) da Austrália e, em parte do território, como Nova Gales do Sul, Queensland e o Território da Capital Australiana, são considerados em perigo de extinção. Nada disso impediu, no entanto, que um grupo de franco-atiradores matasse centenas desses marsupiais no Parque Nacional Budj Bim, uma ampla reserva natural localizada no sul do país. Fizeram isso a partir de helicópteros, com o respaldo do governo e supostamente por “razões humanitárias”.

A grande pergunta é… por quê?

Franco-atiradores, helicópteros e coalas. A princípio, são três conceitos que não parecem ter muita relação entre si, mas são os protagonistas da polêmica que abalou em abril o estado de Vitoria, no sul da Austrália, onde se localiza o Parque Nacional Budj Bim. No final do mês, a imprensa local começou a noticiar que estavam sendo sacrificadas ali centenas e centenas de coalas.

Se a notícia já não fosse surpreendente (e triste) o bastante, ganhou ainda mais repercussão ao se revelar como a matança está sendo realizada: os animais estão sendo abatidos a partir de helicópteros com a ajuda de franco-atiradores. Tudo isso, é claro, com o aval do Departamento de Energia, Meio Ambiente e Clima (DEECA), a autoridade responsável pela conservação ambiental, como confirmou recentemente a emissora ABC.

Os números exatos de quantos coalas foram abatidos podem variar de acordo com a fonte consultada, mas todas concordam em algo: a campanha está acabando com centenas de coalas na região. No meio do mês, conforme a notícia avançava, o Yahoo News reportou que entre 600 e 700 marsupiais haviam sido sacrificados. Há ativistas que, no entanto, elevam esse total para mais de 700 exemplares e, no dia 24/4, a agência Europa Press (AP) arredondou o número, falando em “até 750 coalas”.

A explicação

As execuções acontecem por razões humanitárias, segundo alegam as autoridades de Vitoria. Os abates fazem parte de uma campanha de eutanásia motivada, segundo o governo, pelo incêndio florestal que devastou em março cerca de 2.200 hectares do Parque Nacional Budj Bim. As chamas teriam afetado parte da fauna (incluindo os coalas) e destruído cerca de 20% da reserva natural. O resultado: animais feridos, abandonados e privados de boa parte dos eucaliptos dos quais dependem para se alimentar.

Não há outras opções?

Embora o uso de helicópteros e franco-atiradores possa parecer chamativo (e pouco ortodoxo), o governo de Vitoria afirma que a decisão foi tomada após “avaliações exaustivas” e que os coalas abatidos estão “gravemente afetados” pelo incêndio florestal. Mais do que isso, o DEECA afirma que não encontrou alternativas viáveis para lidar com o problema além de contratar atiradores profissionais e colocá-los em helicópteros.

“Todos os outros métodos considerados não são adequados, dada a impossibilidade de acessar com segurança grandes áreas da paisagem afetada a pé, devido à localização remota dos animais — que muitas vezes se encontram no alto das copas das árvores —, ao terreno extremamente acidentado e aos riscos envolvidos em trabalhar numa zona atingida pelo fogo e com árvores danificadas”, explicou James Todd, representante do DEECA, à Vox Magazine.

Todos concordam com isso?

Não. E uma boa prova disso é que as notícias sobre a campanha geraram intensa polêmica no estado de Vitoria, em toda a Austrália e até fora do país. O motivo: a dimensão da medida.

O partido Justiça Animal denunciou que as autoridades locais “não estão fazendo nenhum esforço” para verificar, por exemplo, se as fêmeas abatidas do alto têm filhotes. A Aliança pelos Coalas vai ainda mais longe e afirma que os técnicos não têm como saber, a partir do alto, se os animais estão realmente em “más condições”. “Parece muito indiscriminado”, concorda Rolf Schlagloth, pesquisador da CQUniversity Australia especializado em coalas. “O resgate sempre deve ser a primeira opção, se for possível.”

Entre ativistas e especialistas, não foi apenas a matança seletiva de coalas que gerou indignação. Ao longo dos últimos dias, também se levantaram vozes que veem no que aconteceu em Budj Bim um exemplo a mais da “má gestão da espécie e seu habitat” e alertam para os efeitos da derrubada de eucaliptos, assim como para a ameaça do aquecimento global e dos incêndios.

“Não podemos eliminar completamente os incêndios florestais, mas florestas mais saudáveis e com maior continuidade podem ajudar a reduzir o risco e a gravidade dos incêndios. O habitat dos coalas precisa ser extenso e conectado, e a gestão das plantações de eucalipto azul deve considerar os coalas”, conclui Schlagloth em uma entrevista recente à Vox Magazine.

Atentos às derrubadas

Esse último ponto é importante. Em outro artigo publicado no The Conversation, Liz Hicks e Ashleigh Best, duas especialistas em direito da Universidade de Melbourne, lembram que o Parque Nacional de Budj Bim está cercado por plantações comerciais de eucalipto azul, vastas áreas de vegetação que acabam recebendo coalas em busca de alimento.

O problema é que essa disponibilidade de folhas leva ao aumento das populações do marsupial. E uma vez que as plantações são derrubadas, esses mesmos animais retornam ao parque protegido. O resultado: maior pressão sobre a área e maior vulnerabilidade a incêndios como o de março. “Os ativistas apontam que a derrubada de árvores é uma das razões pelas quais Budj Bim tinha tantos coalas”, acrescentam.

Imagens | Arctic Warrior (Flickr) e Nghia Nguyen (Unsplash)

Este texto foi traduzido/adaptado do site Xataka Espanha.

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