O problema já é conhecido na China há tempos: o envelhecimento da população e a baixa taxa de natalidade, tudo isso em meio a uma economia desacelerada. A questão é a solução encontrada.
No mês passado, diante do colapso na natalidade, a China tomou uma decisão drástica: suspender as adoções internacionais. O movimento mais recente é ainda mais "invasivo": bater de porta em porta e pressionar as mulheres a terem filhos.
A notícia
O New York Times relatou recentemente o caso de Yumi Yang. No dia em que ela foi registrar seu casamento, um funcionário do governo a incentivou a ter um bebê, embora ela não tenha dado muita atenção.
O homem chegou a entregar vitaminas pré-natais gratuitas para ela. Pouco tempo depois, outro funcionário ligou para perguntar se ela havia tomado as vitaminas e, mais tarde, quando ficou grávida, entrou em contato novamente para saber se estava tudo bem.
Meses depois, vários funcionários apareceram na sua porta após o nascimento do bebê, pedindo uma foto dela com a criança para os arquivos deles. Parece que a situação de Yang não é um caso isolado.
Diante de uma população em declínio que ameaça o crescimento econômico, o governo chinês está recorrendo a uma tática que já utilizou no passado: interferir nas decisões mais íntimas das mulheres, como a escolha de ter ou não um filho.
Nova política: aumentar a natalidade
A campanha do governo chinês não se limita a bater de porta em porta para perguntar às mulheres sobre seus planos. Ela também inclui cursos universitários sobre casamento e criação de filhos, além de ser promovida em reuniões políticas de alto nível.
Nesse contexto, Xi Jinping destacou a maternidade como uma responsabilidade pública, refletindo a prioridade do Partido Comunista em aumentar a taxa de natalidade. Atualmente, essa taxa está entre as mais baixas do mundo, com um índice de fertilidade estimado em 1,0.
A campanha faz parte de um esforço mais amplo para mudar as atitudes sociais em relação ao casamento e à maternidade.
Reclamações nas redes sociais
Nas redes, muitas mulheres têm criticado as abordagens feitas por funcionários locais. Algumas relataram que foram contatadas para responder perguntas pessoais, como a data do último ciclo menstrual.
A maioria considera essas intervenções invasivas e fora de contexto, apontando que o governo ignora os desafios reais, como os altos custos de criar filhos e a dificuldade de conciliar maternidade e carreira.
O New York Times conversou com um grupo de mulheres de bairros onde os funcionários têm promovido a fertilidade. As gerações mais jovens, especialmente aquelas nascidas após os anos 1990, parecem não ter filhos como prioridade, em contraste com as gerações anteriores.
Ainda assim, algumas reconhecem pontos positivos na campanha, como os recursos extras para cuidados infantis e o incentivo para que os homens assumam mais responsabilidades no lar.
Controle rigoroso e políticas do passado
Por trás do esforço atual do governo chinês, há temores de um retorno ao passado e ao controle reprodutivo. Desde o final dos anos 1970, a China implementou de forma rigorosa a política do filho único, chegando a aplicar multas e forçar abortos.
Essa medida foi uma resposta às preocupações com o rápido crescimento populacional da época, que aproximava o país da marca de um bilhão de habitantes e levantava dúvidas sobre seu impacto econômico.
Embora as campanhas atuais ainda não tenham alcançado esse nível de controle, a intervenção do governo nos planos das mulheres, somada a um discurso cada vez mais forte sobre a redução de abortos considerados desnecessários, alimenta o receio de que as liberdades reprodutivas possam ser restringidas no futuro.
Em algumas cidades, por exemplo, já existem regras que exigem aprovação oficial para abortos realizados após 14 semanas de gestação.
Controle diante de um problema difícil de resolver
Assim como a decisão tomada semanas atrás, que bloqueou as adoções internacionais, a abordagem mais recente do governo em relação à “natalidade” traz uma lembrança inquietante da antiga política de planejamento familiar.
Essa nova estratégia parece ignorar as mudanças sociais em que as mulheres têm maior controle sobre suas decisões. Ao fundo, o grande elefante na sala.
Em 2023, a China perdeu quase 2,1 milhões de habitantes e registrou 9,02 milhões de nascimentos, o número mais baixo desde que os dados começaram a ser registrados. O balanço demográfico do ano passado é ainda mais preocupante porque revela uma aceleração no declínio populacional: entre 2022 e 2023, o país perdeu habitantes pela primeira vez desde os anos 1960, mas de forma menos intensa.
Por isso, não parece que os funcionários vão parar de bater às portas tão cedo.
Imagens| Lon&Queta, TimeLessMoon
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