Gunnar Herrmann trabalha para a Ford há mais de 20 anos. Nesse período, desempenhou diversas funções, incluindo a direção da empresa na Alemanha. Agora, como membro da equipe de supervisão da fabricação de veículos, ele resolveu tornar públicas suas opiniões sobre o estado atual do mercado europeu e seu futuro.
Quem?
Gunnar Herrmann se destacou na Ford ao longo de sua carreira. Em mais de 20 anos como funcionário da empresa, ele desempenhou várias funções, incluindo a direção da Ford na Alemanha, o país mais importante para a empresa na Europa, já que é onde estão suas sedes centrais no continente.
Embora tenha deixado a direção da empresa em 2021, ele continuou na alta administração da companhia. Entrevistado pelo jornal Kölner Stadt-Anzeiger, de Colônia (Alemanha), onde a Ford possui uma das plantas mais afetadas pela queda na produção de veículos, Herrmann aponta os motivos que, em sua opinião, são responsáveis pela situação que estamos vivendo atualmente.
Herrmann menciona, em sua entrevista, um erro grave: “a filosofia pela qual se vendiam milhões de Volkswagen Golf ou Ford Focus está morta. A venda de carros não será suficiente”. O executivo acredita que o hardware já não basta para colocar um carro no mercado. “No futuro, o dinheiro será gerado, cada vez mais, através da arquitetura digital, ou seja, do uso pago de aplicativos e funções”, destacou.
O software tornou-se o novo foco do setor automobilístico. Cada vez mais, as fabricantes consideram que ele será um diferencial. Na China, essa abordagem aparentemente ajudou a atrair novos clientes e convencer antigos adeptos de marcas como Volkswagen e Porsche. A própria Ford admitiu que se surpreendeu com as ofertas no mercado chinês.
A grande questão é se o mercado europeu está preparado para absorver essas novas dinâmicas. Os fabricantes têm enfrentado dificuldades para tornar rentáveis as assinaturas baseadas em software, e algumas, como a BMW, recuaram em pacotes de assinatura, como os de aquecimento nos assentos.
"Ficaremos para trás"
Com essa frase contundente, Herrmann defendeu a transição para o carro elétrico que a Ford está realizando. "Os pequenos fabricantes podem enfrentar multas de dezenas de milhões de euros. A Volkswagen pode enfrentar uma multa de 250 milhões de euros. (...) Podemos ignorar as metas climáticas e continuar fabricando o antigo motor a combustão. Mas o mundo ao nosso redor continua a se desenvolver, e então apenas ficaremos para trás", aponta Herrmann.
Em suas declarações, ele se refere aos novos limites de emissões de CO₂ que entram em vigor em 2025. A partir do ano que vem, a média da frota de carros vendidos na Europa deverá ficar abaixo de 93,6 g/km. Até agora, o peso desempenhava um papel essencial, pois aumentava o limite máximo de emissões permitido. Isso mudará no próximo ano e o único caminho para evitar multas será aumentar as vendas de híbridos plug-in e elétricos.
"Intoxicados por nós mesmos"
"Como indústria automobilística alemã, paramos no tempo e talvez também estávamos excessivamente intoxicados por nós mesmos e pelo nosso passado", diz Herrmann. Na China, "com a estratégia de vender principalmente produtos premium, os fabricantes de automóveis alemães já não avançam, pois a concorrência local agora os supera tecnologicamente".
"Oferecem produtos razoáveis a preços comparativamente baixos e impulsionam as vendas no país com subsídios e descontos. E conquistaram o público mais jovem com uma oferta de veículos mais digital", aponta o ex-diretor da Ford. Essa tem sido, justamente, uma das tarefas pendentes das empresas ocidentais, que têm enfrentado dificuldades para se aproximar da geração Z.
Implicações sobre o emprego
Para Herrmann, a transição para o carro elétrico é impossível para a Ford sem abandonar o motor a combustão. "Se queremos estruturas e produtos rentáveis, então precisamos focar em uma tecnologia. Construir carros elétricos e motores a combustão em paralelo não é eficiente", destacou.
A indústria alemã está em um momento complicado. Já faz um ano que as vendas de carros elétricos caíram drasticamente, devido à retirada inesperada dos subsídios para compra. Com menor volume de vendas, a produção automotiva na Alemanha caiu mais de 8% e marcas como a Volkswagen querem realizar cortes de pessoal. A concessionária Skoda envia a mensagem de que é necessário reduzir o custo das baterias, mas também "reduzir o número de pessoas em geral e implementar mais IA em nossos processos".
"A Ford disse desde o início que não seria rentável [em mobilidade elétrica] até 2027 ou 2028. Infelizmente, a situação piorou com o mercado fraco. Poderíamos ter fabricado o Ford Fiesta por mais algum tempo, mas não faz muito sentido com os novos limites de emissões da UE", sentencia Herrmann.
"O que estamos experimentando são os efeitos de uma transformação", conclui o executivo. A grande dúvida é para onde essa transformação nos levará do ponto de vista trabalhista. A Europa está tentando se proteger dos carros elétricos chineses, mas já são várias as empresas orientais que garantem que entrarão no mercado europeu fabricando no leste ou em países com tratados especiais com a UE (Turquia e Marrocos). Ao mesmo tempo, gigantes como Volkswagen ou Stellantis não param de ameaçar fazer demissões.
Este texto foi traduzido/adaptado do site Xataka Espanha
Foto | Ford
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