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Nem permanentes, nem funcionários públicos: uma confusão judicial deixou interinos da Administração Pública em um limbo jurídico

  • A Lei contra a temporariedade da Administração Pública proibia contratos de mais de três anos para os interinos

  • Duas sentenças contraditórias do Supremo e do Tribunal de Justiça da União Europeia os deixam em um limbo legal

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Sofia Bedeschi

Redatora

Jornalista com mais de 5 anos de experiência no ramo digital. Entusiasta pela cultura pop, games e claro: tecnologia, principalmente com novas experiências incluídas na rotina. 

Na Administração Pública, não há apenas funcionários que conquistam seu cargo por meio de concurso; também existem empregados interinos que ocupam uma vaga com contratos temporários ou indefinidos, como em qualquer outra empresa privada.

Duas sentenças, uma do Tribunal Supremo (TS) da Espanha e outra do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), deixaram esses trabalhadores da Administração em um limbo legal, no qual têm os mesmos deveres que seus colegas funcionários públicos, mas sem alguns de seus direitos.

Agora, a responsabilidade de resolver o impasse está nas mãos das diferentes administrações, criando um verdadeiro caos normativo.

O fim da temporariedade na Administração

Nas últimas décadas, a Administração Pública preencheu vagas com empregados contratados temporariamente, renovando esses contratos de forma recorrente, muitas vezes durante anos consecutivos. Para acabar com essa prática, foi implementada a Lei 20/2021, que estabelece que interinos podem permanecer no cargo por, no máximo, três anos.

Assim que esse prazo é cumprido, abrem-se três possíveis caminhos:

  1. A Administração estabelece uma indenização por rescisão e dispensa esse empregado, substituindo-o por um funcionário público.
  2. O posto é mantido como um contrato indefinido, mas o empregado não adquire a condição de funcionário público por não ter ingressado por meio de um concurso.
  3. O empregado contratado presta o exame para consolidar sua vaga, passando de contratado a funcionário público.

Essas são as três opções que a justiça propõe. O problema é que as sentenças emitidas pelo Tribunal Supremo (TS) em abril de 2024 e pelo Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) em junho de 2024 se contradizem, deixando os empregados contratados em um fogo cruzado. São os "funcionários de Schrödinger": nem são empregados indefinidos, nem funcionários públicos.

A versão do Supremo

De acordo com a sentença do Tribunal Supremo, o processo que um trabalhador interino deve seguir para acessar um cargo fixo na Administração Pública deve ser regido pelo princípio de “igualdade, capacidade e mérito”.

Ou seja, eles não podem obter automaticamente um contrato de trabalho indefinido, mas devem passar por um concurso público para se tornarem funcionários de pleno direito.

"O indefinido não fixo é assim porque seu ingresso na Administração ou em uma empresa pública para um cargo fixo ocorreu sem que tenha sido seguido um processo seletivo para sua incorporação, baseado nos princípios constitucionais de igualdade, capacidade e mérito. Princípios que fazem parte do núcleo básico da regulação da organização e funcionamento das Administrações Públicas espanholas, como garantia do princípio de igualdade proclamado pelo artigo 14 da Constituição", destaca a sentença do Supremo.

A forma de realizar isso é por meio de um dos procedimentos de consolidação de vagas públicas. O problema é que, para isso, os empregados precisam aguardar a abertura dessas seleções, o que pode entrar em conflito com o prazo máximo de três anos estabelecido pela Lei contra a temporariedade na Administração Pública.

A versão do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE):

O Tribunal Europeu se manifestou sobre o caso específico de três empregadas públicas (não funcionárias) da Direção-Geral da Função Pública da Generalitat da Catalunha, que passaram anos com contratos temporários consecutivos.

Esse tribunal determinou que, segundo sua interpretação da legislação espanhola, elas podem ser contratadas como empregadas indefinidas sem a necessidade de passar por um processo de consolidação de vaga. A única exceção é que elas não terão a condição de funcionárias públicas, embora realizem o mesmo trabalho que seus colegas.

Críticas do TJUE à legislação espanhola

A sentença de junho de 2024 do tribunal europeu critica a lei aprovada pelo Governo em 2021, que obriga os interinos a esperar pela abertura de concursos para ter a chance de revalidar um cargo que já ocupavam. Segundo o tribunal europeu, essa medida "não é adequada para sancionar devidamente os abusos".

Além disso, o tribunal também critica a indenização recebida pelos empregados públicos demitidos, seja pelo cumprimento do limite máximo de três anos, seja por não terem passado no exame para a vaga. A sentença afirma que essa indenização não é "adequada para sancionar devidamente a situação, já que estabelece uma remuneração máxima de 20 dias por ano trabalhado e 12 meses de compensação".

O que diz o governo?

José Luis Escrivá, então Ministro para a Transformação Digital e da Função Pública quando a sentença do TJUE foi anunciada em junho (atualmente Governador do Banco da Espanha), afirmou que a Lei de 2021 já havia regularizado 75% dos interinos da Administração Pública, destacando que os casos específicos deveriam ser resolvidos pelos tribunais.

"Os casos anteriores a 2021 dizem respeito fundamentalmente aos tribunais e como eles devem resolver esses conflitos", declarou à EuropaPress. O ex-ministro enfatizou que os processos seletivos para concursos públicos haviam sido agilizados, reduzindo o tempo necessário para a consolidação de vagas, e que a meta de regularizar 300.000 vagas de interinos seria alcançada até o final de 2024.

Nos vemos nos tribunais

Conforme indicado por José Luis Escrivá, os casos mais complexos de consolidação de interinos na Administração Pública têm sido decididos judicialmente. Em julho de 2024, o Tribunal Superior de Justiça da Galícia (TSXG) condenou a Universidade de Vigo a pagar uma indenização de 31.566 euros a um professor interino que estava na função desde 2013.

O docente havia passado no exame de consolidação do seu cargo, mudando seu status de empregado contratado para funcionário público. No entanto, a Universidade de Vigo interpretou essa mudança de condição como uma renúncia ao cargo anterior, negando-lhe a indenização devida pela rescisão do contrato.

O TSXG decidiu a favor do professor, considerando o caso como um despedimento improcedente.

As comunidades começam a estabelecer procedimentos. A Administração Pública abrange desde a Administração do Estado até pequenos municípios, por isso todos aqueles que utilizavam a figura do interino com contrato temporário devem se preparar para a conversão de interinos em funcionários públicos.

Esses procedimentos devem incluir as compensações econômicas decorrentes das indenizações por não consolidação de suas vagas, o que equivale a uma demissão.

Um exemplo é a Generalitat Valenciana, que, segundo o jornal local Valencia Plaza, acaba de apresentar seu plano para estruturar essa transição e solicitar as devidas indenizações quando os interinos não tiverem a intenção de prestar o exame de consolidação de sua vaga ou não o aprovarem, impedindo-os de retornar ao cargo.

Imagem | Unsplash (Arlington Research)

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