Aconteceu em fevereiro, mas o susto foi tão grande que, desde então, os comunicados não pararam de circular, com as diplomacias fazendo hora extra para tentar encontrar um ponto de entendimento sobre o ocorrido. Assim como em Taiwan, a Austrália se deparou em fevereiro com uma situação até certo ponto inédita. De repente, uma frota de navios chineses não anunciada estava realizando exercícios de tiro em suas águas.
O alarme
No dia 21 de fevereiro, um grupo de três navios de guerra chineses (um cruzador da classe Renhai, uma fragata e um navio de abastecimento) entrou na zona econômica exclusiva da Austrália sem declarar seu propósito (a apenas 150 milhas náuticas de Sydney). Segundo o ministro da Defesa australiano, Richard Marles, embora não fosse um fato totalmente inédito, foi considerado “incomum”. E houve mais: na própria sexta-feira, voos comerciais entre a Austrália e a Nova Zelândia tiveram que ser desviados repentinamente depois que os navios chineses alertaram os pilotos de que sobrevoavam uma zona de exercícios com fogo real.
Embora não tenha sido confirmado que os disparos ocorreram no mesmo dia, a Marinha da Nova Zelândia informou que no dia seguinte, 22, houve sim atividade com munição real. A ministra da Defesa neozelandesa, Judith Collins, expressou preocupação, especialmente pela falta de comunicação por parte da China. “Infelizmente, as tensões aumentaram”, afirmou, relembrando o recente lançamento de um míssil balístico intercontinental chinês no oceano Pacífico. Ela admitiu que não se sabe quais serão os próximos movimentos dos navios chineses, o que levou seu governo a solicitar explicações à embaixada do país.
As preocupações
Portanto, embora a China não tenha violado o direito internacional, as autoridades de ambos os países criticaram publicamente a falta de um aviso prévio adequado. E não só isso. O episódio naval ocorreu poucos dias depois de um incidente entre um caça chinês e um avião de patrulha australiano no Mar do Sul da China. Canberra denunciou a ação como “perigosa e pouco profissional”, enquanto Pequim acusou a Austrália de provocação.
O Ministério da Defesa chinês rejeitou as acusações de ambas as nações, afirmando que emitiu múltiplos avisos de segurança com antecedência e acusando os governos australiano e neozelandês de “exagerar deliberadamente” o incidente.
Especialistas consideram que essa incursão tem um pano de fundo estratégico. Michael Shoebridge, ex-funcionário da Defesa australiana, declarou ao Washington Post que a China busca pressionar a Austrália por suas alianças militares com Japão, Filipinas e Vietnã, países que mantêm disputas territoriais com Pequim. Um extra: a China está expandindo sua influência no Pacífico, tentando consolidar acordos de segurança com pequenas nações insulares, o que preocupa Austrália e Nova Zelândia. Além disso, os exercícios também demonstram a crescente capacidade naval chinesa num momento em que busca projetar mais poder na região.
China na região
A presença de navios de guerra chineses no sul do Pacífico soma-se à crescente militarização da região por parte de Pequim. Nos últimos anos, o país aumentou sua presença próxima ao Japão, realizou exercícios com munição real perto da Austrália e desafiou os Estados Unidos no Mar do Sul da China. Mais que isso: segundo o Japan Times, o deslocamento naval em águas a leste da Austrália acendeu os alertas em Canberra e Tóquio.
De acordo com Andrew Shearer, diretor-geral de inteligência da Austrália, esta é a incursão mais ao sul já realizada por um grupo de tarefas da Marinha do Exército de Libertação Popular, e seu objetivo parece ser normalizar a presença militar chinesa na região.
Avaliar a resposta dos aliados
Essa pode ser outra das hipóteses apontadas por alguns especialistas. Shearer alertou que a China não estava apenas enviando uma mensagem à Austrália, mas também buscava avaliar e moldar as respostas dos países da região. Segundo Euan Graham, analista do Instituto Australiano de Política Estratégica, o Exército de Libertação Popular está testando as reações da Austrália e do Japão, ambos aliados-chave dos Estados Unidos.
“A ausência de uma resposta firme por parte da Austrália ou de uma declaração de apoio por parte de Washington só encoraja a China a continuar pressionando. Seu objetivo é normalizar sua presença militar na região e encontrar fissuras entre os Estados Unidos e seus aliados no Pacífico”, explicou Graham.
O que parece bastante claro é que os recentes exercícios navais com munição real da China, agora no mar da Tasmânia, voltaram a evidenciar as tensões no Indo-Pacífico, em especial no Mar do Sul da China e no estreito de Taiwan. Embora a Austrália não tenha disputas territoriais diretas com a China, sua crescente presença naval na região, somada às suas alianças com os Estados Unidos e outras potências asiáticas, parece ser vista por Pequim como um desafio à sua influência.
Imagem | CCTV
Este texto foi traduzido/adaptado do site Xataka Espanha.
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